Alex Barksdale
Perspectivas Anarquistas-Feministas sobre Saúde Reprodutiva e Trans Autônoma
Transfeminismo, Autonomia Corporal, e Feminismo-Anarquista
Autonomia Corporal Transfeminista
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Introdução
Em 24 de junho de 2022, a Suprema Corte dos Estados Unidos (SCOTUS) decidiu, em Dobbs v. Jackson Women's Health Organization, que a Constituição dos Estados Unidos não prevê o direito ao aborto, anulando Roe v. Wade (1973) e Planned Parenthood v. Casey (1992). Um esboço da decisão judicial foi vazado no início de maio de 2022, causando um choque em toda a cultura política dos EUA. Após a decisão do caso Dobbs, vários estados proibiram completamente o aborto, havendo a possibilidade de que surjam outras proibições pela frente. A derrubada bem-sucedida do caso Roe é o ponto culminante de um esforço de décadas da direita política e cristã dos EUA. Essa pressão para criminalizar totalmente o aborto vem sendo combatida há muito tempo nas legislaturas estaduais de todo o país.
Outra tempestade política nos EUA, desta vez com foco em pessoas trans, começou em 2021 e se intensificou em 2022 [1]. A primeira enxurrada de legislação, focada principalmente em jovens, buscou forçar os jovens trans a voltarem para o armário, impedir representações positivas da identidade trans e queer em sala de aula, proibir a participação em esportes e acabar com o precário atendimento de afirmação de gênero (AAG) oferecido à juventude trans [2]. Embora os jovens e seus cuidados com a saúde tenham sido os primeiros alvos, como no Texas e no Alabama, o próprio AAG agora é pauta de projetos de lei em todo o país em 2023, buscando criminalizar sua obtenção ou fornecimento (Rummler 2023). Outros projetos de lei visam retirar as pessoas trans e a diversidade de gênero da vida pública [3]. Além dos edifícios do capitólio, existe a ameaça da crescente retórica eliminacionista da direita que está inspirando a violência estocástica e a violência fascista organizada (Knefel 2022).
Esses ataques à comunidade trans não são exclusivos aos EUA. No Reino Unido, pessoas trans enfrentam um ambiente político e midiático particularmente hostil (Faye 2021). Além disso, conservadores na Europa, na América Latina e alhures estão mirando nas comunidades queer e trans em uma suposta luta contra a "ideologia de gênero", a mais recente reação contra os movimentos feministas e LGBTQ (Wilkinson 2017; Corredor 2019; Bassi e LaFleur 2022; Borba 2022). Entretanto, em relação ao direito ao aborto, houve avanços positivos nos últimos anos, como a legalização do aborto na Argentina, México, Tailândia, Nova Gales do Sul na Austrália e Irlanda. No entanto, a Polônia se juntou aos estados dos EUA para restringir ainda mais o aborto. O cenário para a organização transfeminista é complexo, mas a erosão das liberdades deve ser combatida em todos os lugares.
Nos EUA, bem antes de 2022, o aborto era altamente restrito e de difícil acesso em grande parte do país, apesar de sua legalidade (J. Smith 2019). Mesmo em países onde o aborto faz parte de um sistema de saúde universal, como o Canadá, para determinadas populações, a realização de um aborto pode ser difícil (Sethna e Doull 2013; Calkin e Berny 2021). A inacessibilidade também caracteriza o AAG, que apresenta vários impedimentos (Bakko e Kattari 2020; Romanelli e Lindsey 2020), em grande parte porque o modelo dominante da medicina para transgêneros tem como premissa a exclusividade (Spade [2000] 2006; Dewey 2020). Nesse contexto, as pessoas recorrem ao "faça você mesmo" (DIY) [4] e ao apoio mútuo. Uso o termo práticas autônomas de saúde (PAS) para nomear essas maneiras pelas quais indivíduos e coletivos atendem às suas necessidades de saúde fora da mediação de instituições oficiais. As PAS ganharam importância devido aos impactos sociais e econômicos da pandemia da COVID-19, aos ataques políticos ao aborto e ao AAG e à precariedade da infraestrutura social existente em face de várias crises.
Neste ensaio, examino as PAS transfeministas, incluindo o aborto clandestino e autoadministrado que emerge do contexto da autoajuda feminista (Erdman, Jelinska e Yanow 2018; Murphy 2012; Thorburn 2017) e o uso autogerenciado de hormônios que emerge da "bricolagem trans" e do apoio mútuo (Edenfield, Holmes e Colton 2019; Raha 2021). Defendo que as PAS transfeministas são ferramentas singulares na luta pela autonomia reprodutiva, sexual e de gênero. Além disso, essas práticas ajudam a cultivar imaginações radicais de autonomia corporal e oferecem uma alternativa às políticas liberais feministas e trans que recorrem ao estado. Entretanto, com base no feminismo anarquista e na justiça reprodutiva, afirmo que tais práticas não são suficientes em si mesmas para a conquista da autonomia corporal. Pelo contrário, defendo que as PAS devem ser entendidas e praticadas como parte de movimentos mais amplos de justiça e emancipação.
Transfeminismo, Autonomia Corporal, e Feminismo-Anarquista
Nesta seção, apresento os principais conceitos e estruturas deste ensaio. Também respondo à pergunta: por que associar as questões do aborto e do AAG? Por fim, demonstro por que o feminismo-anarquista é uma perspectiva particularmente apropriada para entender as PAS e a política de autonomia corporal de forma mais ampla.
Autonomia Corporal Transfeminista
Tanto o aborto quanto o AAG são formas de autonomia corporal importantes para as coletividades transfeministas que atualmente estão enfrentando um ataque conjunto. Para entender melhor sua correlação, é interessante definir tanto o transfeminismo quanto a autonomia corporal. O "Manifesto Transfeminista" de Emi Koyama, um texto fundamental dentro do transfeminismo, define-o como "principalmente um movimento de e para mulheres trans que veem sua libertação como intrinsecamente ligada à libertação de todas as mulheres e não só" (2003, 245). O transfeminismo no contexto anglófono norte-americano considera a inclusão trans como parte integrante do feminismo (Arfini 2020). Como uma forma de feminismo interseccional, o transfeminismo se deve a análises feministas negras sobre poder e resistência (Green e Bey 2017). Assim, o transfeminismo pode ser entendido como uma estrutura solidária em que a emancipação em relação à opressão de gênero consiste em um projeto coletivo. Esse projeto ou movimento une intimamente todos os sujeitos oprimidos por gênero, independentemente da identidade ou expressão de gênero, e não impõe limites a quem se beneficia do desmantelamento do cisheteropatriarcado.
Para além da anglosfera, Elia AG Arfini destaca outras genealogias e conotações do transfeminismo no sul da Europa, ou seja, na Espanha, Itália e França. Arfini traça as origens dessa vertente do transfeminismo nas "subculturas sexuais radicais de coletivos, ocupações, artistas pós-pornô, hackers, profissionais do sexo, migrantes e ativistas queer" (2020, 161). A partir desse contexto social, o transfeminismo do sul da Europa apresenta uma "política autônoma, anti-institucional e de ação direta", preocupada não apenas com a emancipação trans, mas também com a justiça racial, econômica e de gênero de forma mais ampla (161) [5]. O transfeminismo do sul da Europa estudado por Arfini é uma política materialista e interseccional radical que se baseia nos fundamentos estabelecidos por Koyama [6].
A autonomia corporal é essencial para todas as vertentes do transfeminismo. Ambos os princípios primários do manifesto de Koyama estão enraizados na autodeterminação:
Primeiro, acreditamos que cada indivíduo tem o direito de definir [sua] própria identidade e esperar que a sociedade a respeite. ... Em segundo lugar, defendemos que temos o direito exclusivo de tomar decisões sobre nossos próprios corpos e que nenhuma autoridade política, médica ou religiosa deve violar a integridade de nossos corpos contra nossa vontade ou impedir nossas decisões sobre o que fazemos com eles. (2003, 245)
Similarmente, em um manifesto que contribuiu para impulsionar o transfeminismo do sul da Europa, as autorias escrevem "¡Nuestros cuerpos son nuestros!". [Nossos corpos são nossos!] (Red PutaLesboNeraTransFemminista 2010, em "Manifiesto para la insurrección transfeminista"). Esses exemplos demonstram a centralidade da autonomia corporal para a política transfeminista, bem como o entendimento amplo quanto às implicações dessa autonomia. Como afirma Joni Alizah Cohen, a autonomia corporal significa "o poder da palavra final e completa sobre o significado de nossos corpos, o que eles fazem e o que é feito com eles" (2019, sob o título). As restrições e a criminalização tanto do aborto quanto do AAG violam esses três elementos.
As restrições ao aborto estão enraizadas em uma ideologia patriarcal que limita o sentido dos corpos das mulheres e seus papéis na maternidade (o que nossos corpos significam) [7]. Impedir um aborto pretendido tira a capacidade de escolher uma intervenção de saúde (o que é feito em nossos corpos), uma intervenção que encerra um processo corporal indesejado (o que nossos corpos fazem). Como argumenta Cohen, "devemos sempre ser capazes de revogar o consentimento, de suspender com segurança os processos biológicos que não são necessários, nem inevitáveis, nem escolhidos" (2019, em "What our bodies do"). Da mesma forma, a criminalização do AAG para jovens trans restringe os cuidados disponíveis (o que é feito com nossos corpos), suprimindo a autodeterminação sobre processos e características corporais (o que nossos corpos fazem). O objetivo dessas restrições é impedir ou reverter a transição dos jovens trans, limitando suas possibilidades de gênero (o que nossos corpos significam). Ademais, como afirma a Federação Anarquista Black Rose /Rosa Negra (BRRNAF), os ataques tanto ao aborto quanto aos direitos trans são "projetados para reafirmar as hierarquias sociais" em uma tentativa de "[reconsolidar] uma ordem social que é percebida como estando sob ameaça" (2022, em "Outlawing Abortion is Patriarchal Domination and Class Warfare"). A capacidade de interromper uma gravidez e de controlar os níveis hormonais e o desenvolvimento corporal são partes fundamentais da luta transfeminista pela autonomia corporal e contra o estado patriarcal, uma luta também travada sob a bandeira do feminismo-anarquista.
Feminismo-Anarquista
As primeiras abordagens anarquistas sobre gênero abrangiam desde a misoginia até a igualdade paternalista de posições separadas, passando por críticas contundentes à opressão de gênero que permanecem radicais e incisivas até hoje [8]. As anarquistas feministas da era clássica desafiaram as ideologias sexistas na sociedade em geral e no meio anarquista. A escritora e oradora americana Voltairine de Cleyre (1914) e a poetisa e militante espanhola Lucía Sánchez Saornil ([1935] 2004) foram teóricas anarquistas pioneiras sobre os papéis de gênero e sua construção social, desafiando noções essencialistas de feminilidade, masculinidade e hierarquia de gênero. Feministas-anarquistas também elucidaram as conexões entre o capitalismo, o patriarcado e o Estado, especialmente em sua manifestação na instituição do casamento. As feministas-anarquistas buscavam abolir o modelo patriarcal de família e, em seu lugar, construir uma cultura de "amor livre" ou "casamento livre", baseada na igualdade e no consentimento [9].
Nos movimentos e na teoria feministas, o anarcofeminismo tem sido historicamente uma vertente marginal. No final do século XIX e início do século XX, as anarquistas-feministas eram frequentemente críticas dos principais movimentos de mulheres, "distintas por sua divergência da política reformista das ativistas da pureza social e das sufragistas e das abordagens socialistas do feminismo que buscavam integrar as mulheres às estruturas atuais, incluindo o Estado" (Nicholas 2018, 606) [10]. Com o vigor renovado dos movimentos por emancipação feminina na década de 1970, bem como as tendências mais radicais e antiautoritárias da Nova Esquerda, o feminismo começou a mostrar mais afinidade com o anarquismo. Essa convergência ocorreu principalmente por meio das formas horizontais de organização que as mulheres empreenderam com base em grupos de afinidade (Kornegger [1975] 2012; Kinna 2018, 265). Mais tarde, com a diversificação do feminismo nas décadas de 1980 e 1990 por meio dos esforços de feministas negras, indígenas e mulheres racializadas, bem como de feministas queer, trans e com deficiência, pode-se observar uma convergência ideológica entre o feminismo e o anarquismo. A interseccionalidade se tornou o cerne do feminismo, em ressonância com o objetivo anarquista de desmantelar todas as formas de dominação simultaneamente (Rogue e Volcano 2012) [11]. Apesar das afinidades, as correntes assumidamente anarquistas permanecem na periferia do feminismo como um todo. Ainda assim, como espero demonstrar neste ensaio, o feminismo-anarquista é uma poderosa perspectiva de análise e ação social, especialmente no que diz respeito à autonomia corporal radical.
Desde o período clássico até os dias de hoje, a autonomia reprodutiva e corporal tem sido um dos princípios fundamentais do feminismo-anarquista. Assim como em relação ao amor, os anarquistas argumentavam que a parentalidade deveria ser livremente escolhida; portanto, defendiam com ênfase o controle da natalidade, a educação sexual e o direito ao aborto. Por causa dessas convicções, os anarquistas estavam na vanguarda dos movimentos em prol da agência reprodutiva, de gênero e sexual, o que muitas vezes resultou na repressão do Estado (Jeppesen e Nazar 2012, 174). Emma Goldman, provavelmente a mais proeminente anarquista-feminista, também foi enfermeira e parteira, tendo atendido mulheres imigrantes. A partir dessa experiência, Goldman (Goldman [1916a] 2016, [1916b] 2016) afirmou que o controle da reprodução era fundamental para a libertação das mulheres, bem como para o amor livre. Ela defendeu fortemente a educação sexual e a disponibilidade de controle de natalidade, o que a levou à prisão em várias ocasiões. A anarquista-feminista japonesa Ito Noe também defendeu o acesso ao aborto, mesmo diante da censura estatal (Reich e Fukuda 1976). Além de apoiar as pessoas que buscavam realizar o aborto por meio de encaminhamentos, alguns anarquistas que eram enfermeiros ou médicos realizavam abortos independentemente da lei, como Marie Equi (Helquist 2015, 85-96). Equi, uma contemporânea de Goldman, atendia às necessidades de saúde da classe trabalhadora em Portland, Oregon, e, assim como Goldman, entendia as conexões entre o controle patriarcal dos corpos das mulheres e a opressão das massas trabalhadoras pelo estado capitalista.
No final do século XIX e início do século XX, houve discussões abertas sobre a homossexualidade e o surgimento da defesa da reforma da criminalização e do estigma cultural que a cercava (Liesegang 2012, 88). Os anarquistas também estavam na vanguarda desses movimentos [12]. Os radicais sexuais anarquistas, incluindo Emma Goldman e Alexander Berkman nos Estados Unidos (Kissack 2008) [13], bem como Senna Hoy, Erich Mühsam e John Henry Mackay na Alemanha (Fähnders 1995), defendiam a homossexualidade e lutavam contra a regulamentação da sexualidade pelo estado e pelas normas comunitárias.
Na década de 1970, após a segunda onda silenciosa de ativismo homófilo na década de 1950, um florescimento radical da organização e militância LGBTQ surgiu com a Rebelião de Stonewall em 1969 (Liesegang 2012, 92) [14]. Os segmentos da Gay Liberation Front (GLF) e a rede que eles formaram foram organizados, em grande parte, em linhas não hierárquicas e utilizaram a tomada de decisão radicalmente participativa baseada em consenso (Kissack 1995). Embora a GLF e suas ramificações, incluindo a Street Transvestite Action Revolutionaries (Shepard 2013) e a Third World Gay Revolution (Latrónica 2009; Third World Gay Liberation [1971] 2010), bem como desenvolvimentos posteriores como a DYKETACTICS! (Bacchetta 2009; Ruth 2009) não fossem explicitamente anarquistas, compartilhavam uma afinidade por meio de suas formas de organização e metas de libertação coletiva (Mecca 2009; Ferguson 2019) [15]. O mesmo se aplica à AIDS Coalition to Unleash Power (ACT UP) e a outras organizações de ação direta relacionadas à AIDS que surgiram como uma resposta radical à pandemia de HIV e AIDS (Shepard 2005). Atualmente, as questões e análises queer e trans são partes integrantes do anarquismo, extraídas tanto da academia quanto das lutas nas ruas (Daring et al. 2012). Em particular, o feminismo-anarquista incorporou as análises e questões do transfeminismo e dos anarquistas trans (Jeppesen e Nazar 2012; Rogue 2012; Herman 2015; Bey 2020). Além disso, as convicções anticapitalistas, antirracistas e antiautoritárias caracterizam a organização radical queer e trans, especialmente porque a abolição do policiamento e das prisões situa-se na vanguarda dos movimentos de libertação (Smith e Stanley 2011; Gossett, Tourmaline e Lewis 2012).
Feminismo-Anarquista como Perspectiva
O feminismo-anarquista como campo de práxis é tanto uma ferramenta de análise como uma base para a ação. A obra de Sandra Jeppesen "Toward an anarchist-feminist analytics of power" (2019) representa uma das elaborações melhor desenvolvidas sobre a utilidade teórica do feminismo-anarquista, partindo de uma compreensão foucaultiana do poder. Como argumenta Jeppesen, "as feministas-anarquistas há muito procuram revelar e desafiar as condições desiguais de poder, trabalhando para criar dinâmicas de poder não hierárquicas em grupos ativistas" (2019, 113). Jeppesen identifica três pontos principais para uma analítica anarquista-feminista: "desestabilização das hierarquias de gênero; desconstrução da divisão público-privado; e restabelecimento da autonomia corporal" (2019, p. 115). Ademais, além do feminismo liberal e da maior parte das formas de feminismo socialista, o feminismo anarquista não considera a legitimidade do estado como garantida, nem procura no estado (ou no mercado) as soluções para os problemas sociais. Neste ensaio, examino as práticas de saúde reprodutiva e trans para entender as respostas anarquistas aos ataques à autonomia corporal, tendo como referência a práxis anarquista-feminista.
Práticas Autônomas de Saúde
Práticas autônomas de saúde demonstram uma profunda afinidade com a práxis anarquista. Essa afinidade existe para além das identificações políticas dos indivíduos ou grupos envolvidos [16]. Defino práticas autônomas de saúde (PAS) como atividades organizadas horizontalmente que visam trazer a autodeterminação aos cuidados de saúde. O termo autônomo, como em "centro social autônomo", conota uma atuação externa à lógica do estado e do capital, identificada pelos anarquistas como a principal barreira à autodeterminação. Ativistas pela autonomia na saúde trabalham para atender às necessidades das pessoas, bem como para desenvolver suas capacidades em atender sua próprias necessidades. As necessidades não atendidas resultam da inacessibilidade do atendimento, seja devido aos altos custos, à distância geográfica, ao controle de acesso ou ao subinvestimento. Mesmo quando o atendimento é acessível, o mesmo pode ser opressivo ou alienante; por exemplo, o movimento feminista de autoajuda foi uma resposta a médicos misóginos, atendimento com fins lucrativos e dependência excessiva de estruturas biomédicas (DudleyShotwell 2020). O atendimento desejado também pode ser criminalizado, como no caso do aborto em muitas jurisdições em todo o mundo. Com as PAS, as necessidades não atendidas são abordadas diretamente por meio de organização autônoma, em vez de se exigir cuidados de saúde às instituições médicas ou ao estado, de modo a refletir os princípios anarquistas. Nesta seção, detalho essas afinidades anarquistas, principalmente por meio de PAS transfeministas, incluindo o aborto e o AAG.
Ação Direta e Apoio Mútuo
Argumento que as PAS podem ser compreendidas por meio dos princípios organizacionais anarquistas de ação direta e apoio mútuo. A ação direta é uma estratégia política que busca efetuar mudanças por fora das instituições hegemônicas de poder e controle (Graeber 2009) [17]. Em vez de buscar reformas políticas por meio do eleitoralismo ou de fazer exigências aos tomadores de decisão, os anarquistas se valem de meios criativos para bloquear ações indesejadas e criar alternativas positivas. A ação direta assume diversas formas, desde a desobediência civil e a sabotagem até a jardinagem de guerrilha e o trabalho direto [18].
As PAS podem ser enquadradas como formas de ação direta por meio da reapropriação dos cuidados com a saúde em mãos leigas. O enfrentamento à autoridade médica e à medicalização é um aspecto fundamental das PAS. A medicalização refere-se a um processo multifacetado pelo qual os problemas da vida passam a ser "definidos e tratados como problemas médicos, geralmente em termos de doenças e distúrbios" (Conrad 1992, 209). Embora a medicalização possa ter efeitos positivos, tais como a redução do estigma ou a disponibilização de recursos específicos para um problema, trata-se também de uma ferramenta de controle social que utiliza o poder e a autoridade da medicina (Conrad 1992). A desmedicalização, ou seja, a reversão da medicalização, raramente é um processo linear ou de simples realização (Halfmann 2012). As PAS não são uma rejeição do conhecimento biomédico; ao contrário, essas formas de desmedicalização e desprofissionalização questionam fundamentalmente quem é o especialista socialmente reconhecido em determinado campo e de quem é o conhecimento a ser levado em consideração. As PAS "retiram medicamentos e outras tecnologias dos ambientes institucionais e treinam pessoas comuns para usá-los com segurança de maneiras que antes eram de competência exclusiva dos profissionais" (Braine 2020, 92). Essa subversão da autoridade médica é um objetivo central da autoajuda feminista e da bricolagem trans [19].
O apoio mútuo vai além da caridade ou dos trabalhos diretos. No anarquismo, o apoio mútuo designa a forma como as coletividades prestam auxílio de forma horizontal com o objetivo de construir uma consciência política em torno dos problemas sociais, econômicos e políticos que tornam esse auxílio necessário em primeiro lugar (Spade 2020). Embora algumas das formas de PAS consideradas aqui também sejam chamadas de "faça você mesmo", por exemplo, "aborto por conta própria", o "faça você mesmo" nunca é solitário (Jeppesen 2018). Em vez disso, o cuidado autogerido é amparado por grupos e redes fundamentados nos ideais de apoio mútuo, outra parte fundamental da práxis anarquista.
PAS Transfeministas
As PAS transfeministas, que utilizo para me referir às práticas de saúde autônomas oriundas de movimentos feministas e trans para atender às necessidades assistenciais de mulheres e pessoas trans de todos os gêneros, têm suas origens nos movimentos interligados de autoajuda feminista e de saúde da mulher da década de 1970 em diante. Esses movimentos buscaram resistir ao complexo médico-industrial patriarcal, capitalista e supremacista branco e criar alternativas feministas (Dudley-Shotwell 2020). A autoajuda feminista baseava-se na ideia de que as mulheres poderiam cuidar de suas próprias necessidades de saúde reprodutiva. Esse esforço envolvia a disseminação do conhecimento de fontes institucionais, como bibliotecas médicas, assim como a elaboração de saberes adquiridos por meio de experimentos pessoais. Pequenos grupos de mulheres se reuniram para aprender sobre sua anatomia e para diagnosticar e tratar condições ginecológicas comuns. Elas também aprenderam sobre saúde reprodutiva, incluindo gravidez, controle de natalidade e aborto. A autoajuda retirou esses problemas das mãos dos médicos, em sua maioria homens, e os colocou nas mãos das próprias mulheres.
Aborto Leigo e Autogerenciado
O aborto leigo, como uma forma autônoma de cuidados com o aborto, não é de forma alguma um fenômeno inédito. Historicamente, antes da medicalização do parto e do aborto, as parteiras auxiliavam em ambos. Entretanto, é somente por meio das inovações dos movimentos feministas que o aborto leigo pode tornar-se seguro e altamente eficaz, tendo sido introduzida a extração menstrual e o aborto medicamentoso autogerenciado [20]. Além das inovações médicas, o aborto leigo foi facilitado pela tecnologia social feminista de grupos de autoajuda e redes que produziam e disseminavam conhecimento.
Embora não seja uma organização explicitamente feminista-anarquista, o Jane Collective é considerado uma inspiração por muitas feministas-anarquistas quando se aborda o acesso ao aborto [21]. O coletivo situado em Chicago, que inicialmente operava como um serviço de referência, começou em 1969 como uma resposta feminista às despesas caras e à falta de segurança dos abortos ilegais. Quando o grupo descobriu, em 1971, que seu principal fornecedor não era de fato um médico, algumas mulheres perceberam que poderiam aprender a realizar abortos por conta própria. A partir de então, Jane passou a operar como uma clínica de aborto feminista autônoma, o que lhes permitiu cobrar uma quantia variável e remover uma barreira significativa para muitas pessoas de baixa renda que buscavam o aborto. Estima-se que o grupo tenha realizado onze mil abortos até a decisão do caso Roe v Wade em 1973 (Brown 2019, 133). Embora operassem em grande parte sem interferência da polícia, isso mudou em 1972, quando sete membros do Jane foram presos e acusados de praticar abortos. Entretanto, após a decisão de Roe, seu advogado conseguiu que todas as acusações fossem retiradas. Com a legalização do aborto nos EUA, o grupo se dissolveu, mas mantém um legado importante que ressoa até hoje.
As feministas em Los Angeles também estavam se organizando para resolver os mesmos problemas associados à criminalização do aborto. Em 1971, Lorraine Rothman e Carol Downer, que faziam parte de um grupo feminista de autoajuda, inventaram a técnica de extração menstrual usando um dispositivo conhecido como Del-Em (Copelton, 2004) [22]. Semelhante à história das mulheres de Jane, Downer teve a revelação, ao observar a inserção de um DIU, de que com o conhecimento e as ferramentas corretas, como o espéculo, o aborto não precisava estar nas mãos vigiadas de poucos. Downer e Rothman começaram a acompanhar e aprender com os agentes clandestinos de aborto.
Um desses agentes, Harvey Karman, já havia desenvolvido uma nova técnica de aspiração a vácuo usando uma cânula flexível acoplada a uma seringa. Isso foi um aprimoramento da técnica comum de dilatação e curetagem, que envolve uma ferramenta de raspagem de metal. Iterando o projeto de Karman, Rothman criou o Del-Em para que fosse mais seguro, mais fácil de operar e mais confortável para a pessoa que estivesse em busca de um aborto. Além disso, o dispositivo "faça você mesmo" foi projetado para ser fácil de montar com peças domésticas comuns e compradas em lojas, como um pote de vidro e tubos de aquário (Murphy 2012, p. 159). A extração menstrual permitia até mesmo que a pessoa que buscava o aborto participasse ativamente do processo, operando a seringa enquanto outra pessoa guiava a cânula. Desde a década de 1970, grupos de mulheres e pessoas trans em todo o mundo construíram, treinaram e usaram a extração menstrual para possibilitar o controle reprodutivo.
As profissionais leigas feministas que praticavam o aborto demonstraram como a desmedicalização era crucial para a construção da saúde e da autonomia reprodutiva. Nos exemplos de Jane e da extração menstrual, as mulheres perceberam que poderiam adquirir o conhecimento e as habilidades necessárias para realizar o aborto por conta própria. Como Downer relembra: "Percebi que, se tivéssemos apenas algumas informações essenciais sobre nossos corpos, não teríamos mais que aturar os abortistas de fundo de quintal" (Chalker, 1993). A autonomia em relação aos sistemas médicos que controlam ou criminalizam e em relação aos serviços "de fundo de quintal" foi ampliada ainda mais com a inovação do aborto medicamentoso, que permitiu que as pessoas que buscavam o aborto pudessem autogerenciar a interrupção de suas gestações.
O aborto medicamentoso autogerenciado deve muito às feministas brasileiras que, na década de 1980, perceberam que o misoprostol, medicamento para úlcera facilmente disponível, poderia ser usado extraoficialmente para o aborto. O misoprostol, uma prostaglandina sintética que causa contrações uterinas, é um método farmacêutico comumente usado para abortos no primeiro e segundo trimestres. Sua eficácia é maior nas primeiras nove semanas de gravidez, quando o misoprostol possui, por si só, entre 85% e 90% de eficácia (Löwy e Dias Villela Corrêa, 2020, p. 679). Quando tomado com mifepristona (RU-486), a eficácia aumenta para noventa e cinco por cento, tornando esse o protocolo preferido. Como a medicação para aborto pode ser usada com segurança e eficácia para o autocontrole da interrupção da gravidez, ela se tornou uma prática comum em países onde o aborto é criminalizado.
Seguindo o trabalho das feministas brasileiras, foram formadas redes em toda a América Latina para orientar as pessoas que buscam o aborto sobre o uso seguro e autogerenciado de pílulas abortivas. Um caso exemplar é o da Argentina, onde grupos feministas, como Lesbianas y Feministas por la Descriminalización del Aborto, administram linhas diretas de informação que oferecem apoio às pessoas que buscam o aborto (McReynolds-Pérez 2017). Normalmente, as pessoas que buscam o aborto obtêm o misoprostol por conta própria, que está amplamente disponível na Argentina. Embora o misoprostol seja mais eficaz no primeiro trimestre, ele também é possível para abortos no segundo trimestre. O Socorristas en Red é um grupo feminista que oferece acompanhamento para abortos medicamentosos no segundo trimestre, com ajuda treinada disponível por telefone antes, durante e depois da interrupção da gravidez (Keefe-Oates 2021). É importante ressaltar que esse trabalho feminista autônomo não só ajudou a tornar mais seguros os abortos criminalizados, mas também fez parte de uma estratégia feminista para desestigmatizar e promover mudanças sociais em torno da questão do aborto. Em 2020, o aborto legal mediante prescrição nas primeiras 14 semanas de gestação foi aprovado na Argentina.
Durante décadas, as feministas responderam à necessidade urgente de aborto seguro, legal e gratuito por meio de ação direta e apoio mútuo. Esse trabalho de longo prazo foi facilitado por meio de inovações técnicas, como a extração menstrual ou o aborto medicamentoso, mas também por meio de formas feministas de organização reconhecidas pelos anarquistas, incluindo grupos de afinidade e redes horizontais. Ao aprenderem sobre seus corpos, arrancarem ferramentas e conhecimentos médicos da medicina institucionalizada e produzirem seus próprios, as feministas criaram modelos para garantir uma autonomia reprodutiva que não dependesse de médicos ou do estado. Esses modelos, dignos de engajamento crítico, são muito importantes no momento atual, em que o acesso ao aborto não é universal e as liberdades reprodutivas são precárias.
Bricolagem Trans
Embora menos documentada do que a autoajuda feminista, a bricolagem trans também revela um histórico de pessoas trans que tomam medidas diretas e formam relações de apoio mútuo para atender às suas próprias necessidades. A bricolagem trans inclui "inúmeras tecnologias para fazer a transição na vida cotidiana, inclusive formas de se vestir, alterar a aparência, fazer maquiagem, amarrar o peito, modular a voz, andar na rua sem ser assediado e participar da vida social pública e privada" (Gill-Peterson 2021, 200). Essas tecnologias também incluem o AAG, que historicamente é feito por conta própria. A medicina trans institucionalizada é um desenvolvimento mais recente e, embora agora seja relativamente usual na maior parte do Norte Global e em partes do Sul Global, ainda é acessível apenas a uma fração das pessoas trans que desejam intervenções médicas [23].
A inacessibilidade do AAG é uma combinação de vários fatores. A medicina trans se baseia em um modelo de controle de acesso que busca restringir o atendimento aos mais "apropriados", ou seja, àqueles que correspondem aos critérios diagnósticos e ao entendimento do profissional de saúde sobre o que é uma pessoa trans [24]. Embora os diagnósticos e os padrões de atendimento tenham se distanciado de expressivas patologizações e da queerfobia, os profissionais de saúde ainda são os supostos especialistas que controlam o acesso ao atendimento (Dewey e Gesbeck 2017; Linander et al. 2019). Caso alguém consiga superar esse primeiro obstáculo, o AAG acaba sendo demasiadamente caro, como nos EUA, onde a cobertura do plano de saúde pode ser negada (Bakko e Kattari 2020). No Serviço Nacional de Saúde do Reino Unido, assim como em sistemas de saúde pública semelhantes, o AAG é segregado em Clínicas de Identidade de Gênero, com longas listas de espera que obrigam as pessoas que buscam atendimento a adiar o acompanhamento necessário por vários anos (Pearce 2018) [25]. Esses atrasos no atendimento têm efeitos prejudiciais, até mesmo mortais, na saúde mental das pessoas trans (Pearce 2018). Por fim, as pessoas trans enfrentam discriminação, assédio e violência nos ambientes de saúde, o que faz com que evitem a medicina institucional (Kattari et al. 2021). Não é de surpreender que as pessoas trans tenham se organizado para ajudar umas às outras a transpor essas barreiras em busca de um AAG competente e de qualidade.
O apoio mútuo é frequentemente retratado como o fornecimento de ajuda material, a exemplo de compartilhamento de alimentos ou amparo em caso de desastres, mas afirmo que a produção de conhecimento e a disseminação de informações que caracterizam a autoajuda feminista e a bricolagem trans não são formas menores de apoio mútuo. Durante décadas, as pessoas trans pesquisaram, reuniram e compartilharam informações sobre o AAG, incluindo quais clínicas e prestadores de serviços têm práticas de afirmação trans e quais devem ser evitadas (Matte 2014; Malatino 2020). Além de analisar o atendimento médico institucional, as pessoas trans também trabalharam para criar formas autônomas de assistência.
A terapia de reposição hormonal (TRH) "faça você mesmo" é uma forma de as pessoas trans atenderem às suas necessidades de saúde para além da medicina institucional trans. Os hormônios são a intervenção médica de afirmação de gênero mais amplamente utilizada e desejada por pessoas trans e das mais diversas identidades de gênero. Embora os sistemas de saúde baseados no consentimento livre e esclarecido, que em grande parte eliminam o controle de acesso, estejam se tornando mais comuns nos EUA e em outros lugares, o acesso a hormônios ainda está fora do alcance de muitas pessoas. Nos EUA, os mercados clandestinos de hormônios, principalmente importados do México, existem desde ao menos o início da década de 1970 (Gill-Peterson 2022). Atualmente, os hormônios podem ser comprados sem receita médica em farmácias on-line em todo o mundo. Os mercados ilegais ou semilegais permitem que se evite o controle de acesso, mas não são, por si só, exemplos de apoio mútuo. Em vez disso, podemos testemunhar a prática do apoio mútuo no compartilhamento de informações e no amparo que permitiu que pessoas trans e não binárias autogerenciassem a terapia hormonal de afirmação de gênero. As zines, um dos pilares da cultura "faça você mesmo" e anarquista, são uma das fontes dessas informações (Edenfield, Holmes e Colton 2019; Raha 2021). Por exemplo, o manual "faça você mesmo" de TRH, Mascara and Hope (2013), "oferece conselhos e instruções para transições de TRH fora dos espaços institucionais para mulheres trans no Reino Unido" (Edenfield, Holmes e Colton 2019, 181). Mais recentemente, surgiram fóruns na Internet e sites wiki sobre o uso autogerenciado de hormônios, fornecendo não apenas informações sobre onde comprar hormônios e métodos seguros de hormonização, mas oferecendo também uma forma de dar e receber apoio mútuo [26].
O campo da assistência médica a pessoas trans está mudando constantemente, derrubando algumas das barreiras já mencionadas. No entanto, ainda falta acesso ao AAG e a cuidados que não sejam baseados em visões cis e heteronormativas sobre as pessoas trans, o que cria a necessidade de alternativas autônomas. Assim como o aborto leigo, a bricolagem trans representa uma forma de desmedicalização, desafiando a autoridade e o papel controlador de médicos e psicólogos na medicina trans [27]. Por meio do apoio mútuo em zines e fóruns trans, as pessoas trans constroem um AAG autônomo.
A autoajuda feminista e a bricolagem trans como práticas de saúde autônomas demonstram que a autonomia corporal não precisa recorrer à legalidade, à providência do estado ou ao mercado [28]. Embora as tendências globais sejam positivas (por exemplo, a legalização do aborto na Irlanda e na Argentina), estamos testemunhando ataques conjuntos aos direitos reprodutivos nos EUA, na Polônia e em outros lugares. Além disso, os ataques ao AAG para jovens nos EUA e no Reino Unido estão ganhando terreno. As PAS não substituem a descriminalização nem descartam a necessidade de lutar por um atendimento de saúde comunitário e com recursos completos, que inclua a saúde reprodutiva e o AAG. No entanto, as PAS fomentam imaginações políticas radicais que não reduzem os cuidados e os direitos ao que pode ser oferecido pelos estados. Defendo que as PAS transfeministas podem ser vistas como tecnologias anarquistas-feministas. No entanto, como qualquer prática, tática ou estratégia política, precisamos avaliar criticamente as PAS para entender tanto seu potencial quanto seus limites.
Movimentos de Saúde Autônomos
Na seção anterior, demonstrei o alinhamento das práticas de saúde autônomas transfeministas com os princípios anarquistas de ação direta e apoio mútuo. Além desses princípios, é imperativo perguntar como as PAS se encaixam em lutas mais amplas por autonomia. O acadêmico e ativista transgênero Dean Spade apresenta critérios interessantes para a avaliação das PAS:
Em meu próprio trabalho, estudando e participando de projetos de emancipação queer e trans e em organizações voltadas para a abolição de fronteiras e prisões, baseei-me em quatro perguntas principais como critérios de avaliação de reformas e táticas: Ela proporciona alívio material? Ela exclui uma parte especificamente marginalizada do grupo afetado (por exemplo, pessoas com antecedentes criminais, pessoas sem status de imigração)? Ela legitima ou expande o sistema que estamos tentando desmantelar? Mobiliza as pessoas, especialmente as mais diretamente afetadas, para a luta contínua? (2020, 133)
Essas são questões empíricas para os ativistas que exigem um estudo conjunto, que é necessário, mas que ultrapassa o escopo deste trabalho. Prefiro usar as perguntas de Spade como pontos de partida para considerar de forma mais ampla as implicações das PAS para a práxis anarquista. Nesta seção, analiso mais a fundo a imaginação política das PAS, dialogando com o feminismo-anarquista, a redução de danos, a justiça reprodutiva e a abolição.
Alívio Material
Suprir as necessidades materiais de forma coletiva e autônoma sempre foi parte integrante do projeto anarquista. Trata-se de uma postura prefigurativa, que harmoniza os meios com os fins de uma sociedade anarquista. Juntamente com o anarquismo, os movimentos de transformação social radical também destacaram a necessidade de atender às necessidades materiais, não apenas como uma responsabilidade ética, mas como uma parte necessária da estratégia revolucionária. Um exemplo proeminente e uma inspiração para os anarquistas são os projetos de apoio mútuo do Black Panther Party (BPP). Em resposta ao empobrecimento das comunidades negras desfavorecidas nos EUA, o BPP criou serviços sociais comunitários, como o programa Free Breakfast, escolas comunitárias e clínicas de saúde (Potorti 2017). Esses programas foram enquadrados como "sobrevivência iminente à revolução". O BPP sabia que a luta pela libertação dos negros necessitava de pessoas cujas necessidades estivessem sendo atendidas.
Uma estrutura que quero abordar para entender por que e como as PAS podem oferecer alívio material é a redução de danos. A redução de danos permite navegar em situações em que as práticas são criminalizadas e/ou os meios mais seguros de sobrevivência não estão disponíveis. Christopher B. R. Smith destaca os paralelos entre a filosofia da redução de danos e o anarquismo e argumenta que a redução de danos é uma "prática fundamentalmente de inspiração anarquista" (2012, 210). A redução de danos, que surgiu da organização comunitária entre usuários de drogas em resposta à pandemia de HIV e AIDS, busca tornar mais seguras as atividades estigmatizadas e criminalizadas, sem tentar eliminá-las (C. B. R. Smith 2012). Além disso, a redução de danos está "enraizada em lutas por justiça que desenvolvem práticas pragmáticas e autônomas que aumentam a autodeterminação e abordam questões de saúde estigmatizadas, muitas vezes criminalizadas" (Braine 2020, 87). Como no caso do apoio mútuo, parte do que torna a redução de danos radical é a politização do dano e a revelação das estruturas que o produzem [29].
Alívio material significa mais do que comida e abrigo. Um grau de autonomia reprodutiva e corporal é necessário para a sobrevivência, o que significa alívio da gravidez forçada e da generificação forçada. Ter as ferramentas e as informações certas é fundamental para a autodeterminação de uma pessoa. As PAS transfeministas têm como objetivo manter as comunidades seguras, mas também têm o potencial de estimular mudanças mais amplas, de acordo com as raízes anarquistas da redução de danos.
A gravidez é um risco para a saúde de muitas pessoas. Em 2017, aproximadamente 810 mulheres morriam todos os dias por causas evitáveis relacionadas à gravidez e ao parto (Organização Mundial da Saúde 2019). Nos EUA, as taxas de mortalidade materna, já bem acima de outras nações do Norte Global (Tikkanen et al. 2020), têm aumentado nas últimas décadas e persiste uma grande lacuna racial, o que significa que as mulheres negras têm uma probabilidade muito maior de morrer por causas relacionadas à gravidez do que as mulheres brancas (Collier e Molina 2019). Além da morte e de consequências prejudiciais à saúde, estudos mostram que as pessoas a quem o aborto é negado e suas famílias enfrentam situações sociais e econômicas piores (Foster 2021). Ser capaz de interromper uma gravidez indesejada é um aspecto fundamental da autonomia corporal e da autodeterminação.
O aborto é um fenômeno antigo, que ocorreu e ocorrerá independentemente de seu status legal. Como diz um slogan pró-escolha comum, "só se pode proibir o aborto seguro". A criminalização do aborto leva as gestantes que estão desesperadas a recorrer a práticas arriscadas. A redução de danos nesse contexto implica fornecer informações precisas sobre o aborto autoadministrado e, se possível, meios fáceis de obtenção dos medicamentos adequados (Erdman, Jelinska e Yanow 2018, 14). Tornar o aborto autoadministrado seguro e acessível abre possibilidades de autonomia e sobrevivência.
Ser capaz de fazer a transição também é uma questão de sobrevivência para as pessoas trans. Como observa Harry Josephine Giles, “A transição é o esforço que… produz vidas generificadas vivíveis sob condições intoleráveis” (2019, 5). O AAG pode ter impactos significativos nas perspectivas de vida das pessoas trans, principalmente em relação à segurança e ao acesso ao emprego. Negar a transição, como a criminalização do AAG busca fazer, prejudica as pessoas trans, tendo consequências fatais. A bricolagem trans e o apoio mútuo constituem refúgios comunitários e são uma ferramenta na engrenagem do estado cissexista.
Outro quadro necessário para interrogar as PAS transfeministas é a justiça reprodutiva (JR). A JR surgiu da organização de feministas negras, indígenas e outras mulheres racializadas em resposta ao histórico de controle reprodutivo de pessoas racializadas e colonizadas, incluindo estupro, separação familiar e esterilização não consensual (Price 2020). A JR é uma crítica e uma alternativa ao feminismo liberal unilateral que aborda os direitos reprodutivos como equivalentes ao direito ao aborto e à contracepção. Combinando uma estrutura de direitos humanos, a interseccionalidade e a crítica estrutural feminista negra, a JR entende que as liberdades reprodutivas vão muito além do direito de prevenir ou interromper uma gravidez. Loretta Ross e Ricki Solinger articulam a JR como "(1) o direito de não ter um filho; (2) o direito de ter um filho; e (3) o direito de criar filhos em ambientes seguros e saudáveis" (2017, 9). Assim, a JR adota uma abordagem holística da autonomia reprodutiva, que incorpora justiça racial, econômica, por deficiência, migrante e ambiental. A autonomia reprodutiva não é plenamente conquistada sem todas essas lutas.
Embora a JR não seja uma perspectiva explicitamente anarquista, ela se preocupa principalmente com a violência do estado e compartilha uma visão de libertação coletiva e de provisão social que ressoa com o anarquismo. De fato, as anarquistas-feministas se inspiram no movimento de JR (Jeppesen e Nazar 2012, 175). Como observam J. Rogue e Abbey Volcano, "Os defensores da justiça reprodutiva têm argumentado a favor de uma abordagem interseccional para essas questões, e uma análise feminista anarquista da liberdade reprodutiva poderia se beneficiar da utilização de uma análise interseccional anarquista" (2012, 46). Uma abordagem fundamentada na JR em relação às PAS compreenderia e vincularia a autonomia corporal do acesso ao aborto e ao AAG a outras formas de autonomia conquistadas em projetos como soberania alimentar, defesa da moradia, alternativas comunitárias ao policiamento e fechamento da infraestrutura de combustíveis fósseis; todos fazem parte da criação de ambientes seguros e de apoio que tornam as vidas mais vivíveis. Não obstante, a JR também desafia os limites dos projetos autônomos de pequena escala, que (ainda) não acarretam mudanças estruturais em larga escala.
Marginalização
Assim como a JR criticou a exclusão da política de aborto feminista branca, é necessário perguntar quem se beneficia das PAS transfeministas e quem poderia ser excluído. O movimento feminista de autoajuda da década de 1970 era um assunto majoritariamente branco e de classe média. No entanto, são em grande parte as pessoas racializadas, indígenas, pobres, migrantes e com deficiência que não têm acesso a um atendimento de saúde de qualidade nos EUA. Que tipo de diferença as atividades clandestinas podem fazer em relação a essas desigualdades estruturais? Além disso, que problemas de acesso existirão? Com relação ao aborto, a BRRNAF argumenta que "mesmo a infraestrutura clandestina mais bem-sucedida deixará muitos milhões de pessoas sem acesso fácil ou seguro aos serviços" (2022, em "The Tasks Ahead"). É claro, porém, que as pessoas envolvidas com essa infraestrutura clandestina ou que a defendem não a concebem como uma solução pronta para esses problemas. Antes, essas perguntas devem orientar como as PAS são vistas estrategicamente.
Atualmente, no contexto dos EUA, a questão da criminalização representa um obstáculo significativo para aqueles que se envolvem com PAS, especialmente com relação ao aborto. Embora a disponibilização imediata de pílulas abortivas ou extração menstrual possa contornar alguns problemas de acesso, a questão da criminalização cria outros. Atualmente, as pessoas que buscam o aborto e optam pelo aborto autogerenciado são principalmente aquelas com poucas ou nenhuma outra opção. Em geral, elas são aquelas que já estão sujeitas a uma vigilância e criminalização intensas devido à supremacia branca, ao colonialismo histórico e ao imperialismo das fronteiras. Esse nexo de contextos jurídicos conservadores e marginalização social exige uma reflexão profunda em torno não apenas sobre como colocar os comprimidos nas mãos das pessoas. O que acontece depois é igualmente importante.
Em contextos jurídicos antiaborto, o aborto espontâneo e os resultados adversos da gravidez estão sujeitos ao escrutínio policial (Grant 2022). Os materiais informativos sobre o aborto medicamentoso autogerenciado aconselham a pessoa que busca atendimento a solicitar atenção médica no caso de complicações, que, embora raras, podem ocorrer. Os materiais de orientação geralmente afirmam que a pessoa que busca o aborto não precisa revelar o uso de drogas abortivas e pode, em vez disso, dizer à equipe médica que sofreu um aborto espontâneo [30]. Por exemplo, o zine How to Give Yourself an Abortion destaca: "Se tomado ... conforme as instruções, um médico não poderá determinar se você induziu um aborto ou se teve um aborto espontâneo 'natural'". No entanto, uma vez que o aborto natural pode ser motivo de policiamento e assédio legal, essa forma de negação plausível não é uma base sólida de proteção [31]. Além de colocar as pílulas nas mãos das pessoas, a redução de danos significa informar verdadeiramente os riscos legais envolvidos. Muitos manuais abordam esses riscos, incluindo o How to Give Yourself an Abortion; entretanto, nem todos o fazem e o cenário jurídico está sempre mudando, exigindo informações atualizadas. Uma preocupação especial na era do capitalismo de vigilância é o rastro de dados que uma pessoa que busca o aborto pode deixar, desde pesquisas na Internet até aplicativos de monitoramento de menstruação (Black 2022; Digital Defense Fund 2022).
As PAS podem ajudar a contornar os problemas de acesso causados pela criminalização, mas não eliminam os riscos associados a ela e esses riscos não são igualmente enfrentados. As PAS, assim como o aborto autogerido, ainda representam medidas eficazes de redução de danos e os ativistas de redução de danos são bem preparados para atuar em contextos de criminalização. Para desafiar esses regimes legais, no entanto, as PAS e a redução de danos precisam estar conectadas com o trabalho de organizações para lidar com esses riscos, o que inclui fundos de fiança, representação legal, campanhas para retirar acusações e a criação de cidades-santuário.
Esse é um ponto forte de aliança entre os movimentos da JR e os movimentos de abolição do policiamento e das prisões. Vale a pena ouvir os ativistas da justiça reprodutiva e as organizações que há muito trabalham com essas questões. A descriminalização do aborto é necessária para criar uma atmosfera segura na qual o aborto possa ocorrer, bem como para manter as pessoas fora do sistema de justiça criminal. Portanto, além de colocar as pílulas nas mãos das pessoas, o aborto autogerenciado exige organização para eliminar a criminalização em curto prazo e, em última instância, para abolir os sistemas de criminalização em longo prazo.
(Des)legitimação
Alinhados com os princípios anarquistas de ação direta e apoio mútuo, as PAS trabalham para deslegitimar os atuais sistemas hierárquicos e violentos que controlam os cuidados de saúde. Como afirma Dana M. Williams, as táticas anarquistas "cumprem com uma função diagnóstica que enquadra negativamente as práticas sociais mediante uma análise anarquista" (2018, 107). Quando a ação direta é eficaz, ela mostra o poder de trabalhar por fora da máquina do estado. Da mesma forma, o apoio mútuo demonstra que podemos atender às nossas necessidades de forma autônoma.
Além disso, as PAS, como atos de desmedicalização, contestam a autoridade de especialistas e instituições da medicina. Como argumenta Naomi Braine, "o aborto seguro fora do sistema médico reúne os diferentes elementos da desmedicalização de forma direta; as mulheres assumem o controle do conhecimento e das tecnologias que permitem abortos seguros, o que as empodera diretamente em relação às instituições médicas e aumenta sua autonomia e autodeterminação" (2020, 91). Essa contenda não é, e nem deveria ser, uma rejeição total da experiência médica. Pelo contrário, as PAS podem criar novos paradigmas na medicina e demonstrar que a assistência médica pode ser diferente e, ainda assim, atender às nossas necessidades. O mesmo se aplica à terapia hormonal de afirmação de gênero, em que o uso autogerenciado de hormônios não é apenas uma alternativa ao atendimento mediado por profissionais, mas uma contestação do próprio modelo medicalizado que sustenta as concepções dominantes da identidade trans. No entanto, as PAS não atendem a todas as formas necessárias de aborto ou AAG, o que demonstra a necessidade de soluções mais holísticas.
Mobilização
A questão da mobilização está relacionada à diferença entre apoio mútuo e caridade. Como muitos anarquistas argumentaram, o apoio mútuo se distingue da caridade, em parte, pelo aspecto de conscientização política da prática (Spade 2020). Ou seja, o apoio mútuo busca não apenas atender às necessidades materiais imediatas, mas construir uma força social que possa enfrentar os problemas que produzem essas necessidades negligenciadas. Esse esforço exige a construção de um imaginário político compartilhado que desmistifique as raízes dos problemas sociais e entenda aqueles que recebem o serviço como agentes políticos capazes. A conscientização pode nem sempre fazer parte das PAS, mas foi incorporada em muitos projetos. Por exemplo, o coletivo Jane forneceu literatura feminista radical em suas salas de espera, discutindo o patriarcado como a fonte da criminalização do aborto. Da mesma forma, os coletivos latino-americanos que oferecem assistência ao aborto autogerido fornecem "educação política feminista em oficinas e materiais sobre o uso seguro de medicamentos para o aborto" (Braine 2020, 87).
Além disso, as PAS podem ser vistas por meio do conceito anarquista-feminista de capacitación, proveniente do Mujeres Libres, um grupo anarquista-feminista ativo durante a Guerra Civil Espanhola (de Heredia 2007, 43; Jeppesen 2019, 120). De acordo com Marta Iñiguez de Heredia, "A capacitação das mulheres significava um processo de desenvolvimento das habilidades e da confiança que lhes permitiriam lutar por sua emancipação" (2007, 48) [32]. A ação direta e o apoio mútuo cultivam um senso de agência e, conforme discutido acima, conferem legitimidade aos atores cotidianos, não ao aparato estatal. Embora essa capacitação possa permanecer inexplorada, ela é um recurso útil para conectar as PAS com movimentos mais amplos, o que, na minha opinião, é necessário para uma articulação anarquista-feminista mais crítica da autonomia reprodutiva e corporal.
Com base nos avisos de Spade, podemos ver que as PAS transfeministas podem ser estratégias úteis de ação direta e apoio mútuo para atender às necessidades materiais. As PAS transfeministas mostram que as necessidades de sobrevivência podem ser atendidas, mantendo nossas comunidades vivas e seguras sem depender do estado. Além disso, essas práticas, atuando tanto como crítica quanto como alternativa, podem ser importantes catalisadores para a politização e o fortalecimento individual e coletivo.
Entretanto, a autonomia e a saúde não podem ser alcançadas somente por meio de pílulas. A BRRNAF argumenta que "a criação de serviços provisórios alternativos não é suficiente" (2022, em "The Tasks Ahead"). Em vez de práticas de saúde autônomas, Braine (2020) afirma que precisamos discutir e construir movimentos de saúde autônomos. Ou seja, precisamos posicionar e entender as PAS como ocorrendo dentro de contextos mais amplos, como é o caso dos movimentos sociais. Essa conexão é evidente no ativismo pelo aborto na América Latina, onde a facilitação do aborto autogerido está ligada a campanhas pelo aborto seguro, legal e gratuito (Keefe-Oates 2021) [33]. A BRRNAF destaca a necessidade de conceber as lutas pela autonomia corporal como parte da luta de classes. Apelam para movimentos sociais que possam se engajar em rupturas em massa, ou seja, "campanhas de longo prazo de ação direta estrategicamente orientada: greves trabalhistas/estudantis/sociais/de aluguel, bloqueios, ocupações e outras táticas inovadoras que apliquem uma pressão coordenada séria sobre o estado e a economia" (2022, em "The Tasks Ahead").
Além disso, as PAS não são e não podem ser uma alternativa às infraestruturas médicas e de saúde coletivas. Embora alguns aspectos da saúde e do bem-estar sejam passíveis de abordagens desmedicalizadas e do tipo "faça você mesmo", muitos aspectos não o são. No caso do AAG e do aborto, muitas intervenções e avaliações exigem equipes médicas altamente qualificadas e especializadas, que não podem ser substituídas pela bricolagem trans ou pelo aborto clandestino. No entanto, os imaginários políticos radicais das práticas de saúde autônomas podem ajudar a imaginar como os sistemas de saúde de base podem ser construídos e quais princípios poderiam incorporar. Essa concepção pode ser auxiliada pelos muitos exemplos de infraestruturas de saúde em zonas autônomas, como os territórios zapatistas (Zibechi 2019), ou as inúmeras clínicas de saúde autônomas na Grécia (CareNotes Collective 2020).
Conclusão
Neste artigo, argumentei que as práticas transfeministas de saúde autônoma são uma ferramenta poderosa, embora limitada, para a conquista da autonomia reprodutiva e corporal. Além disso, as PAS estão em posição privilegiada para oferecer uma resposta feminista-anarquista à criminalização e à inacessibilidade da atenção à saúde reprodutiva e de afirmação de gênero. Feministas-anarquistas sabem que não podemos contar com o estado para defender nossas liberdades. O estado sempre pode revogar essas liberdades, como ficou evidente no caso Dobbs. Precisamos de uma alternativa, uma contra-hegemonia, à política liberal trans e feminista dominante que acredita que a emancipação virá de um estado mais diversificado e de um capitalismo inclusivo.
Feministas-anarquistas buscam desenvolver a capacidade de autodeterminação individual e coletiva partindo das bases. Isso inclui formas de ação direta e apoio mútuo, como as PAS transfeministas. Além disso, devem ser formadas infraestruturas sociais autônomas para o cuidado e a resistência, desde cozinhas comunitárias e clínicas trans "faça você mesmo" até ocupações e sistemas de aborto autogerenciados, construindo as relações sociais prefigurativas. Amplos movimentos em massa do poder da classe trabalhadora, apoiados por essa infraestrutura autônoma, poderiam representar o desafio necessário para quebrar o domínio do estado e do capital, abrindo caminhos para futuros mais anarquistas-feministas.
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[1] Embora a perseguição estatal às comunidades trans nos EUA esteja em andamento há décadas, há aumentos cíclicos, com 2021-2023 mostrando números recordes consecutivos de projetos de lei antitrans apresentados nos órgãos legislativos estaduais dos EUA (Trans Legislation Tracker 2023).
[2] Esses ataques também devem ser vistos em conjunto com as teorias de conspiração da supremacia branca em torno da teoria crítica racial, bem como com os esforços de décadas para minar a educação pública nos EUA.
[3] Para consultar um catálogo da legislação proposta e promulgada, consulte o rastreador de legislação trans em https: //translegislation.com/.
[4] Nota do tradutor: a sigla DIY, em inglês, se refere a “Do It Yourself”, ou seja, “Faça Você Mesmo” em tradução livre.
[5] Arfini afirma que o ativismo transfeminista inclui "violência baseada em gênero, descriminalização do trabalho sexual, direitos reprodutivos, homonacionalismo e migração, críticas antiausteridade do neoliberalismo, gentrificação e políticas assimilacionistas de gays e lésbicas" (2020, 161). Consulte também Egaña e Solá (2016), Espineira e Bourcier (2016) e Baldo (2019).
[6] Koyama admite que seu manifesto original carece de uma lente interseccional rigorosa (2003, 258).
[7] Eu utilizo “corpos das mulheres” aqui porque as mulheres (cis) são o foco principal dos opositores ao aborto.
[8] O historiador Sharif Gemie argumenta que o anarquismo clássico exibia um "duplo paradoxo" (1996, 418). O primeiro paradoxo descreve a desconexão entre os ideais anarquistas de igualitarismo e antiautoritarismo e o sexismo dos homens anarquistas. O segundo é que as vertentes feministas ainda surgiam em uma cultura política e social geralmente sexista e misógina.
[9] A crítica da anarquista chinesa He Zhen à estrutura familiar ultrapassou a de muitos de seus contemporâneos europeus e americanos, defendendo a criação dos filhos como uma responsabilidade social alcançada por meio de creches coletivas (Zarrow 1988; Jeppesen 2019, 127; Song 2022). Nem todos os anarquistas abraçaram o "amor livre", como a anarquista americana Lucy Parsons, que criticou o amor livre como problemático para as mulheres em uma sociedade patriarcal (Rocha e Rocha 2019).
[10] Embora, como observa Ruth Kinna, as anarquistas-feministas de fato admirassem as táticas de ação direta militante das sufragistas britânicas (2018, 276).
[11] Sobre iniciativas anarquistas críticas da interseccionalidade, ver Breton et al. (2012), Rogue e Volcano (2012), Dupuis-Déri (2016), Kinna (2018), Lazar (2018), e Jeppesen (2019).
[12] É claro que também havia homofobia/heterossexismo generalizado dentro do movimento anarquista.
[13] Como observa Terence Kissack, "a primeira concepção sustentada nos EUA do lugar social, ético e cultural da homossexualidade ocorreu no movimento anarquista de língua inglesa" (2008, p. 3).
[14] Embora Stonewall tenha sido a mais impactante, rebeliões (ou motins) anteriores atuaram para politizar as comunidades LGBTQ, como foi o caso da Compton's Cafeteria Rebellion em São Francisco em 1966 (Worley 2011; Keller e Morris 2021).
[15] Como observa Tommi Avicola Mecca sobre a GLF, "o sexismo, a transfobia e o racismo dentro do movimento emergente levaram à separação de mulheres, transgêneros e pessoas de cor" (2009, xii).
[16] Como observa Dana M. Williams, "as táticas do movimento anarquista não precisam ser utilizadas apenas por anarquistas autoconscientes; outros podem utilizar táticas 'anarquistas' que espelham nitidamente aquelas utilizadas pelos próprios anarquistas" (2018, 107).
[17] Vicente Ordóñez define ação direta da seguinte forma: "Por meio de ação não mediada, indivíduos e grupos oprimidos tentam derrubar ou destruir aquilo que os submete" (2018, 75).
[18] Nota do tradutor: na versão original, a expressão “trabalho direto” está como “direct service”, que significa atuar ativamente na realidade que se deseja transformar - um exemplo são casos de limpeza comunitária ou de mutirão. Não consegui pensar em uma expressão em português que representasse exatamente o “direct service”, e “voluntariado” não me pareceu apropriado, pois não necessariamente se refere ao mesmo tipo de situação. Fico à disposição para receber sugestões: mltpfeil@gmail.com.
[19] Nota do tradutor: traduzi “DIY” (faça você mesmo) como “bricolagem”.
[20] O herbalismo é uma parte significativa da história do aborto, o que inclui o ativismo anarquista-feminista e autônomo em torno do aborto. No entanto, não abordarei o aborto à base de plantas neste ensaio, principalmente porque o aborto medicamentoso tornou-se tão amplamente disponível que é a abordagem preferencial de redução de danos para o aborto autogerenciado.
[21] As fontes anarquistas primárias que discutem o Jane Collective incluem Highleyman (1992), Love and Rage Revolutionary Anarchist Federation (1997), CrimethInc Ex-Workers Collective (2018) e Black Rose / Rosa Negra Anarchist Federation (2022). As fontes acadêmicas secundárias incluem Jeppesen e Nazar (2012), Van Meter (2012) e Beswick (2022).
[22] Devido à criminalização do aborto na época, o Del-Em usava como disfarce o argumento de que era feito para que a menstruação ocorresse de uma só vez.
[23] A transgeneridade não é redutível à medicalização da diversidade de gênero, e nem todas as pessoas trans desejam intervenções médicas relacionadas a gênero.
[24] Isso muitas vezes força as pessoas trans a contorcerem suas narrativas e apresentações em padrões cisnormativos (Dewey e Gesbeck 2017; Linander et al. 2019).
[25] Isso demonstra como o AAG não é tratado como uma prioridade ou não se investe nele. Além disso, embora seja apropriado que alguns aspectos do AAG, como a cirurgia, sejam classificados como tratamento especializado, a terapia hormonal pode ser facilmente prescrita e monitorada por médicos da atenção primária (Gardner e Safer 2013). Ao restringir todo o AAG no Reino Unido às Clínicas de Identidade de Gênero, as pessoas que procuram atendimento podem ser forçadas a esperar vários anos entre um encaminhamento e o acesso efetivo à terapia hormonal.
[26] Esses sites se concentram muito na transição transfeminina e no uso de estrogênios. Esse é um resultado da classificação da testosterona como uma substância controlada.
[27] De fato, como argumenta Jules Gill-Peterson, a bricolagem trans é "plausivelmente o maior, mais abrangente e perspicaz acervo de conhecimento sobre sexo e gênero que surgiu desde o século XX" (2021, p. 202).
[28] Entretanto, é claro que muitas das práticas listadas ainda dependem, em grande parte, do setor e dos mercados farmacêuticos. Faltam alternativas não capitalistas para a produção de medicamentos.
[29] No entanto, como a redução de danos se institucionalizou, ela pode se afastar de suas raízes radicais e se tornar uma estratégia de saúde pública despolitizada (C. B. R. Smith 2012).
[30] Os manuais de aborto autogerenciado devem sempre recomendar a via oral da medicação e observar que a inserção vaginal pode deixar evidências do uso da medicação, um risco legal.
[31] Além disso, depende de o usuário se lembrar de uma história de fachada e se sentir confortável em não revelar todas as informações durante uma emergência médica.
[32] Ver o uso de "joy" conforme descrito em Joyful Militancy (2017), de Nick Montgomery e Carla Bergman.
[33] Embora menos documentado, a bricolagem trans também pode ser vista como parte dos movimentos de justiça de saúde trans.