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Alfredo M. Bonanno
Alguns Erros Teóricos Muito Comuns
A) Um país que é economicamente dependente de outro não pode ser politicamente independente.
B) A nação é um fenômeno essencialmente cultural.
C) A luta de libertação nacional está desatualizada.
D) A libertação nacional é uma necessidade apenas da burguesia.
A exploração da classe operária se dá de duas formas precisas que se articulam por meio de um complexo sistema de cumplicidade: a primeira é a direta, realizada pela burguesia nacional. A segunda é indireta, exercida pela burguesia de outras nações.
Essa repartição, entretanto, não é baseada em um conceito étnico de nação. A exploração interna não é realizada pela burguesia nacional no papel de representantes étnicos do poder, mas como representantes políticos dos centros de gestão do poder centralizado. Ou seja, todos os Estados que existem hoje, na Europa por exemplo, provêm de um núcleo primitivo e preponderante que foi gradativamente, ao longo da história, incluindo e dominando os núcleos periféricos politicamente e militarmente mais fracos.
Na Espanha, foi Castille que o pôs em prática. Na França, o norte sujeita as províncias do Sul. Na Grã-Bretanha, os Ingleses dominam os Galeses, os Escoceses e os Irlandeses. Na Alemanha, é a Prússia que realiza essa tarefa, submetendo os pequenos estados Alemães, Dinamarqueses e Poloneses e até mesmo províncias como a Alsácia-Lorena, objeto de discussões intermináveis com a França. O mesmo fenômeno ocorreu na Rússia: os Grandes-Russos dominam os Romenos, Finlandeses, Lituanos e Poloneses. Na Áustria, um grupo de Alemães coalizados impõe domínio sobre Gregos e Eslovacos, Magiaris, Poloneses e Italianos, pelo menos até 1918.
O processo de formação dos grandes Estados modernos caracterizou-se, portanto, por uma série de imposições externas. As unidades étnicas são destruídas, obrigadas a se submeter à centralização administrativa e com isso a exploração se agrava.
Este não é o tipo de conclusão a que chegam os marxistas. Eles, pelo contrário, pensam que a função do monarca dos estados absolutos foi progressiva. Engels escreve: “Uma vez que as fronteiras foram formadas entre os grupos linguísticos, era natural para eles fornecer a base para a formação de estados e para que as nacionalidades comecem a se desenvolver em nações. O rápido colapso de um Estado de etnia mista como a Lotaríngia mostra a importância desse elemento já no século IX. É verdade que o período medieval estava longe de coincidir os limites linguísticos e territoriais; ainda, cada grande nacionalidade, com a exclusão da Itália, foi representada na Europa por um Estado particular de extensão considerável e cada vez mais clara e consciente, e a tendência de criar estados nacionais no período medieval constitui um dos instrumentos mais essenciais de progresso …” (F. Engels, Uber den Verfall des Feudalismus und das Aufkommen der Bourgeoisie, em Marx-Engels, Werke, vol XXI, pp 395 e sgg, citado por I. Fetscher, Il Marxismo, Milão 1970 vol III pp. 62–63). Em oposição a essas teses, Kropotkin escreve: “… não importa o quanto o desenvolvimento do Estado no modelo da Roma imperial tenha posto fim violentamente a todas as instituições de ajuda mútua da época medieval, este novo aspecto da civilização não pode durar. O Estado, baseado na vaga agregação de indivíduos e apenas em laços de união, não alcança esse fim. Então, a tendência de ajuda mútua quebra as leis de bronze do estado …” (P. Kropotkin, Mutual aid), e Bakunin: “Esses precursores (os Estados enfraquecidos) devem entender qual era sua fraqueza no passado, e que sua incapacidade de formar um Estado constitui sua força hoje, seu direito a um futuro, e dá sentido a todos os movimentos nacionais presentes”. (M. Bakunin, State and anarchy)
A função reacionária e centralizadora da emergência e do fortalecimento dos Estados poderosos é muito clara na situação em que se encontra a Sicília. No momento da passagem dos Bourbons para os Piemonteses, houve um aumento incrível da pressão fiscal. O total do imposto territorial passou de 50 para 70 milhões em 1866, enquanto o Centro e o Norte pagam 52 milhões entre eles. A venda de bens eclesiásticos trouxe ao estado unitário cerca de 600 milhões, embora houvesse mais gastos públicos no norte do que no sul. O Estado unitário gastou cerca de 92 milhões na Lombardia para obras hidráulicas e 1.333.296 milhões de liras na Sicília. A média nacional per capita desses custos é de 19,71 liras, enquanto na Sicília é de apenas 0,37 liras. Muito se falou sobre o grande gasto da ferrovia na Sicília: no período de 1861–1898 cerca de 479 milhões foram gastos, enquanto em todo o território nacional o investimento nacional foi de 4 bilhões – 76 milhões.
O problema da libertação nacional como tal não pode ser realmente compreendido se não for colocado nesta perspectiva de dupla exploração. Se se perder este fio quando se fala da burguesia local, porque ela se encontra agindo de forma étnica, o sentido da luta de classes se perde, caindo da frigideira para o fogo.
Não é verdade que a burguesia local faça menos reivindicações do que a externa. Toda a burguesia é a mesma. A homogeneidade de classe dos explorados não pode destruir-se a partir de uma concepção separatista, deve-se antes inserir-se dentro de uma ótica revolucionária, restabelecendo os princípios gerais da luta de classes que vem da base, uma luta contra a exploração que se faz em nome do povo, não em nome de uma casta interna e indígena.
Condenando toda a burguesia e todas as aspirações ao poder das minorias restritas, condenando qualquer discurso que pretenda passar por cima dos explorados, condenando qualquer decisão que diga respeito às etapas do processo revolucionário e a duplicidade daqueles que afirmam aceitar compromissos que não podem ser mantidos, juros que não podem ser pagos e compromissos que não podem ser honrados; condenamos qualquer deformação da luta de libertação nacional, luta que deve assumir uma matriz interna.
Não há contradições entre essas duas perspectivas. A luta de libertação nacional torna-se uma banalidade burocrática, um carrasco sangrento em nome dos patrões barrigudos que ficam no conforto de suas poltronas, torna-se um crime horrível perpetrado à custa do povo, se não for inserido no contexto de uma caminhada para o internacionalismo revolucionário proletário.
Uma vez que se aceite a tese de que a burguesia interna é igualmente contrária aos verdadeiros interesses do povo, quanto a externa – que o inimigo chama de oportunistas para confundir as ideias –, é preciso também aceitar que o isolamento proletário de um núcleo étnico libertado é um suicídio revolucionário. Seu olhar deve necessariamente estar voltado para o exterior, sob pena de morte da própria revolução. Qualquer revolução hoje que pretenda colocar-se em bases autárquicas – se não econômicas, pelo menos políticas e de convivência – é impensável. Uma vez que isso seja esclarecido, permanece o outro problema, de onde dirigir o olhar.
Os movimentos e organizações revolucionárias do proletariado dos países dominantes não podem ser imediatamente levados em consideração: a maioria dos países Europeus mais a URSS, os Estados Unidos e a China, eles não podem ser levados em consideração porque estão muito envolvidos em sobreviver a uma situação de terrível repressão, ou estão empenhados em tentar encontrar ou recuperar sua identidade em uma situação que é dispersiva ou em constante mudança. Depois, há os movimentos revolucionários e as organizações proletárias dos países onde já existe uma luta de libertação nacional razoavelmente eficaz em curso: alguns países Europeus, alguns países Árabes, alguns países Latino-Americanos. Se nosso interlocutor continua sendo o proletariado revolucionário de todo o mundo, o proletariado revolucionário que luta por sua própria libertação nacional pode ser considerado um interlocutor privilegiado.
Esta linha de interpretação parece fora de discussão para nós. A partir daí é possível desenvolver uma proposta organizacional baseada, obviamente, no preconceito da luta contra a burguesia interna e externa.
Esse discurso deve estar na lógica do federalismo, deve partir da base, e levar em conta as pequenas comunidades locais coordenadas entre a produção e a gestão. Os objetivos futuros da comunidade libertada e daqueles organizados livremente em federações, como aqueles em curso de libertação lutando para criar esta organização que podemos definir como autogestionária devem ser: a destruição completa de uma perspectiva integral que faz do indivíduo a base da sociedade.
Na perspectiva de contribuir para o esclarecimento de algumas das questões relativas à luta de libertação nacional de forma mais concreta, examinaremos alguns dos problemas que são levantados com mais frequência pelos adversários deste projeto revolucionário.
A) Um país que é economicamente dependente de outro não pode ser politicamente independente.
Este é um equívoco comum mesmo entre os camaradas revolucionários que aceitam o projeto da luta de libertação nacional, pelo menos em parte. Esses camaradas insistem no fato de que nesta perspectiva é necessário fortalecer a economia de um país ou parte de um país para melhorar o processo de separação em curso, acelerando os elementos que concorrem a favor da cisão. Este é o tipo de erro que Marx cometeu ao escrever para Engels, ele se alegrou com a vitória de Bismark sob a ilusão de que o reforço da burguesia nacionalista alemã (Prussiana) significava um reforço paralelo das organizações do proletariado.
Em uma situação como a atual na Sicília, claramente dependente do mercado italiano e, através dele, do internacional, nenhuma perspectiva de libertação nacional seria possível – se esta tese fosse válida. Na verdade, raciocinando desta forma, descobriríamos que nem a burguesia Siciliana nem o proletariado estariam interessados em sua libertação, a primeira porque está economicamente ligada à burguesia Italiana, e o segundo porque só poderia ser libertado ao mesmo tempo que o proletariado Italiano. Se pode haver algum fundamento para esta posição no que diz respeito à burguesia Italiana, já que ela não poderia aceitar sua autonegação, estando apenas disponível para o embate na esperança de conseguir impor o seu domínio absoluto; não é válido para o proletariado Siciliano, que poderia estabelecer as condições para a futura libertação do proletariado Italiano a partir de sua própria libertação, e não vice-versa. A unidade do proletariado Italiano e Siciliano não é negada na luta de libertação nacional do primeiro, mas é reconfirmada na perspectiva futura de libertação de ambos. O mesmo não pode ser dito para a burguesia Italiana, que percebe mais facilmente, livre como é da ilusão da ideologia nacionalista, a dificuldade de formular uma relação de colaboração com uma provável futura burguesia nacional dominante.
O fato de que a autodeterminação política de um país põe em ação processos muito difíceis de administrar para o proletariado revolucionário, é outro problema. Isso reingressa no conjunto mais geral de questões relativas à necessidade ou não do proletariado de participar de uma revolução parcial (econômica e política), e tentar impor, dentro das capacidades de suas próprias forças, a revolução social.
B) A nação é um fenômeno essencialmente cultural.
O problema se reduz apenas ao elemento espiritual, negando legitimidade à autodeterminação política.
De fato, muitos Estados estão enfatizando de maneira bastante óbvia a caracterização étnica que distingue grupos sociais individuais. A divisão em regiões do estado Italiano responde às necessidades de forma subordinada, mas corresponde principalmente à diferenciação étnica. O fato de se insistir tanto no uso das línguas locais, e que é o próprio estado Italiano que está financiando a pesquisa e as cadeiras Sicilianas são elementos de um mosaico maior onde o estado dominante quer encerrar a necessidade básica de libertação. Então, fala-se Siciliano na Sicília e, por que não, Alemão em Triest e Bolzano, para que a exploração continue. A burguesia local aperta melhor seus acordos com aqueles em nível nacional, satisfazendo seus próprios estímulos nostálgicos de um dessueto nacionalismo, enquanto esse proletariado se diverte com sentimentos que os bajulam e continuam a sofrer sob o jugo dos patrões. Se a nação fosse apenas um fato espiritual e cultural, o máximo que se poderia pedir às forças disponíveis para uma luta de libertação nacional na Sicília seria lutar por uma edição melhor, mais recente e completa do melhor dicionário Siciliano-Italiano disponível. Mas não é assim que as coisas estão. A uma unidade étnica de natureza cultural e espiritual corresponde uma dimensão política precisa: nos limites em que esta dimensão acaba por ser um elemento de coagulação das forças revolucionárias, é do interesse do proletariado e de todos os explorados empenhar-se para alcançar as consequências lógicas, as de uma revolução econômica e política. Cabe a todos os revolucionários, no curso da própria luta, criar as condições necessárias para o desenvolvimento da revolução social.
C) A luta de libertação nacional está desatualizada.
De acordo com este lugar-comum, toda organização de luta pela libertação nacional está inserida no campo real da luta de classes, permanecendo ligada aos ideais anacrônicos típicos da pequena burguesia reacionária. Objeção que não apreende o aspecto contraditório das situações em que, justamente, a unidade étnica se calcula por uma dominação substancialmente estrangeira. A aceitação de tal tese é igual à da outra, que sustenta que todo separatismo é revolucionário, mesmo o nostálgico e realmente anacrônico da burguesia nacional. O que conta na realidade da luta é justamente a contradição dos interesses e diferenças entre a espera dos vários grupos sociais e a verdadeira possibilidade de realizá-la. Cada movimento de libertação nacional é, portanto, caracterizado por um duplo aspecto: tem um potencial revolucionário e um resíduo reacionário anacrônico. O primeiro se encarna na capacidade de luta proletária, o segundo nas reivindicações gerenciais da burguesia. Este movimento é, em si mesmo, o resultado da luta de classes, que se revelou em constante modificação. No entanto, ele não pode ser santificado no altar da glória revolucionária, nem lançado na lama e no pó da reação. Dizer que é apenas uma dessas duas características que caracterizam o movimento de libertação nacional, significa supor que uma aliança estável é possível entre o proletariado revolucionário e a burguesia. Na verdade, significa dar o possível uma colaboração cega interclassista, quando, em vez disso, a realidade nos mostra continuamente contradições que estão sempre em ebulição.
D) A libertação nacional é uma necessidade apenas da burguesia.
Outro erro sério. Esta é a tese defendida por Kautsky: “… a classe capitalista equipará seus interesses aos de toda a nação. Quanto mais alta a mais-valia dos capitalistas de uma nação, maior a prosperidade da nação aos nossos olhos; para eles, patriotismo significa perseguir os interesses da mais-valia que bolsam os exploradores de uma nação … eles não pretendem tal dedicação à pátria, sacrifício de bens e sangue, tanto quanto exploração da pátria, que deve entrar no campo os deuses e o sangue de suas massas populares para proteger os lucros de seus capitalistas no exterior. A pátria não existe para o povo tanto quanto as massas populares existem para a pátria …” (K. Kautsky, Patriotismus und Socialdemokratie, Leipzig, 1908, pp. 8–10). E, continuando em sintonia com a tese marxista da consolidação do Estado como anti-sala da consolidação operária, continua, “Burguesia e proletariado … têm o mesmo interesse em eliminar a divisão feudal da nação em pequenos Estados e apátridas, na reunificação de todos os elementos que vivem em um mesmo território e falam a mesma língua, em um Estado nacional, visto que esta reunificação representa um enorme progresso no que diz respeito a essa desagregação e é uma condição importante para o desenvolvimento da produtividade do trabalho” (Idem p. 12). É uma questão de posições que não levam em consideração a relação concreta que se passa entre a autodeterminação política e o contexto real da luta de classes. Fazendo isso, pode-se chegar à conclusão de que, como uma fase com uma matriz política clara, a autodeterminação representa apenas uma exigência utópica que os sonhadores retrógrados seguem, sem perceber que o capitalismo avançado já foi além desses princípios nacionais (instâncias). Mais uma vez, este erro não reconhece o papel ativo e determinante do proletariado na luta. A autodeterminação política, o reconhecimento da necessidade da libertação nacional não são apenas um vago sonho utópico da burguesia, mas também um sentimento que é fortemente sentido pelas camadas proletárias. Ora, se na classe burguesa esta afirmação se nutre de projetos de domínio que são de fato utópicos, quando considerados separadamente na perspectiva do capitalismo avançado; o mesmo sentimento na classe proletária é extremamente realista, pois é capaz de construir, justamente no momento da passagem, a centelha que desencadeia as condições do embate revolucionário.
Isso não significa que – especialmente na Sicília – não se deva levar em conta os chamados “sonhadores retrógrados”. Aqui, os últimos estão orientados para um progressivismo parasitário geral e inócuo (para eles) e, portanto, bloqueiam energicamente qualquer luta que mova a base proletária. O partido comunista e as recentes forças radicais os fascinam e condicionam. Eles representam o álibi da burguesia latifundiária e industrial dotada de outros meios, mas também de outra mentalidade. Refletem uma realidade que se divide em duas, que não pode ser considerada unitária e que está muito longe da homogeneidade. Na prática, não é possível realizar um discurso político-cultural que leve em conta a dicotomia econômica que sustenta o contraste desenvolvimento-subdesenvolvimento. Por isso a realidade de quem vive as durezas do subdesenvolvimento é determinada não só pelo que representa como situação específica, mas o que representa para todos, inclusive para quem vive em contato com estruturas abertas ao projeto de desenvolvimento. Certamente, por meio dessas experiências, se fossem realizadas por meio de uma difusão inteligente de ideias, uma mudança em algumas das atitudes de muitos camaradas que não têm o hábito de considerar a pobreza do sul como a raiz da causa, não tão simples efeito da industrialização do Norte, da chamada grande democracia de algumas regiões privilegiadas. Mas esse fato por si só não é suficiente. É preciso que fique claro que a pobreza do sul corresponda à riqueza do Norte, o antigo estilo de vida no cenário feudal do Sul corresponde ao estilo dinâmico de vida moderna do Norte, o subdesenvolvimento do Sul está ligado por uma lógica inextricável ao desenvolvimento do Norte: a lógica do capitalismo. Para existir, de fato, o capitalismo ainda hoje, na era multinacional, precisa da existência de uma área de subdesenvolvimento para usar no sentido colonial do termo.
O jogo internacional do imperialismo não impede o jogo local do colonialismo à moda antiga. Nesse sentido, o sul paga o custo do norte e trabalha para o enriquecimento deste. Parece-nos mais do que nunca óbvio que não será possível melhorar as condições de vida do proletariado Siciliano e do sul em geral, se não quebrar definitivamente a relação desenvolvimento-subdesenvolvimento e instaurar uma nova lógica de tipo revolucionário. Até o sonhador siciliano pode se inserir nessa perspectiva denunciando a função substancial de freio e sustentação do poder que muitos mais sonhadores afortunados, agindo nas áreas privilegiadas do norte industrial, volenti ou nolenti, consciente ou inconsciente, realiza. O filtro da cultura pesa sobre qualquer possibilidade de resgate do sul somando-se às demais forças reacionárias que ali encontram grande espaço e grande apoio: fascistas, mafiosos e afins.
E) A teoria das nações reacionárias.
Um erro estranho que muitas vezes volta à moda e que produziu colapsos no passado. Muitas vezes, muitos camaradas, embora o neguem em nível teórico, manifestam uma espécie de reação visceral contra algumas nações que são vistas como reacionárias como tais. O exemplo mais comum desse erro é feito por aqueles camaradas que apóiam as lutas e a posição teórica de alguns grupos étnicos como os negros na América, os Palestinos, os católicos na Irlanda do Norte, para os quais os grupos adversos, Americanos brancos, Judeus Israelenses, protestantes Ingleses na Irlanda do Norte imediatamente se tornam exemplos de nações reacionárias.
Engels falou com grande desprezo dos povos sem história e condenou as nações à dura escravidão, pelo menos até a libertação revolucionária que era necessário alcançar através das grandes nações que estão centradas em um forte movimento operário. Bakunin, por outro lado, olhava com simpatia para as nações fracas porque via nelas os precursores da libertação de amanhã. Assim, ele escreveu em uma famosa passagem de Estado e anarquia:
“Os perseguidores Eslavos devem finalmente compreender que o tempo em que se podia brincar inocentemente com a filologia Eslava acabou e que nada é mais absurdo e ao mesmo tempo mais nefasto, mais mortal para o povo do que fazer o pseudo-princípio da nacionalidade, o ideal de todas as aspirações populares. A nacionalidade não é um princípio comum a toda a humanidade, mas um fato histórico, limitado a um distrito, fato que tem sem dúvida, como tudo o que é real e inofensivo, o direito de se ver reconhecido por todos. Cada nação, mesmo a menor, tem seu caráter, seu modo de viver, de se expressar, de sentir, pensar, agir; e é este personagem, este modo de ser, que constitui precisamente a essência da nacionalidade, produto de toda uma época histórica e de todas as condições de existência do povo”. Diferente, por outro lado, da posição marxista de Engels: “O significado Europeu de um povo, sua vitalidade não vale nada do ponto de vista do princípio da nacionalidade; para tal princípio os Romenos da Valáquia, que nunca tiveram uma história própria nem energia para fazê-la, contam na mesma medida que os Italianos com sua história bimilenar e as energias nacionais não consumidas; os Galeses e os habitantes da Ilha de Man teriam, se assim o desejassem, e por mais absurdo que possa parecer, o mesmo direito que os Ingleses a uma existência nacional independente. A coisa toda é um absurdo envolto em roupas populares para jogar fumaça nos olhos dos ingênuos e que se pode usar slogans convenientemente ou jogar fora, de acordo com as circunstâncias”.
Foi justamente esse erro típico da nação reacionária que alimentou toda a questão do chamado Manifesto dos Dezesseis. O grupo editorial do Temps Nouveaux se dividiu em dois grupos desde o início de 1916. A situação em Paris e em todo o movimento anarquista Francês e internacional ficou quente. Em 14 de março “La Bataille” publicou o Manifesto assinado por quinze pessoas (o décimo sexto era a localidade argelina de Hussein Dey, confundido com um militante). Entre os nomes estavam anarquistas bem conhecidos em todo o mundo: Grave, Malato, Pierrot, Paul Reclus, Cornelissen, Cherhesov e Kropotkin. No documento dizia-se, entre outras coisas, “Com aqueles que estão lutando consideramos que, a menos que a população Alemã, voltando a propostas mais sensatas de justiça e de direito, renunciando a servir mais de instrumento do projeto de dominação política pan-Alemã, não se pode falar de paz”. Uma frente contrária a esta posição foi formada imediatamente. De Londres, Malatesta respondeu com uma peça intitulada: Anarquistas e Governo.
F) A luta de libertação nacional desemboca necessariamente em revolução política precisamente porque se trata de uma demanda política.
Outro erro que se deve ao determinismo marxista. Como no caso do primeiro dos equívocos aqui considerados, aquele onde um país economicamente dependente de outro não pode ser independente, afirma-se que a luta pela autodeterminação política permanece necessariamente no quadro econômico que o caracteriza. Não devemos esquecer que, como anarquistas, participamos de todas as lutas pela liberdade, desde que tenham a característica essencial das lutas insurrecionais de base, ou seja, ver presentes as massas junto com a ação dos grupos revolucionários minoritários com programas politicamente e ideologicamente diferenciados, mas suficientemente claros para não haver dúvidas sobre seus objetivos. Não podemos, como frequentemente afirmamos, reservamos nossa intervenção apenas à luta guiada pelos anarquistas para as lutas que supomos ter uma porcentagem suficiente garantida de vitória. A luta se desenvolve na luta, nunca é um modelo estático que se reproduz mecanicamente sempre da mesma maneira. Nossa própria presença também nas lutas que começam muito longe dos objetivos anarquistas pode causar modificações tais como consentir uma abordagem considerável aos objetivos revolucionários do anarquismo. Ora, as lutas de libertação nacional têm justamente esta estrutura: são fortemente contraditórias, apresentam elementos que teria sido melhor se não existissem, mas que existem e que nenhuma intenção piedosa pode excluir. Se os anarquistas querem ser puristas, que sejam, mas as revoluções nunca foram feitas com o purismo e a exibição franca de sua própria retidão ideológica. Ainda menos insurreições foram realizadas. Lutar em todas as ocasiões possíveis para que as melhores condições possíveis para a insurreição popular em massa sejam realizadas, na medida do possível, autogerido, é a tarefa fundamental dos militantes anarquistas. E a luta de libertação nacional tem muitas possibilidades de partir na direção da insurreição.