Errico Malatesta
Os anarquistas e o movimento operário
Os leitores puderam ver na seção “Notas romanas”, de 15 de junho, um relatório relativo às relações entre os anarquistas e o movimento operário que pode provocar críticas e que, em todo caso, deve ser explicado. Por exemplo: o que significam esses “grupos internos filiados à União Sindical Italiana” que os anarquistas deveriam formar? Com que frequência dissemos que simpatizamos com a União Sindical Italiana, e sabemos perfeitamente que em certas regiões do país é graças à atividade desses camaradas que nossas ideias e nossos métodos desenvolveram-se rapidamente. Simpatizamos igualmente com todas as organizações operárias, como, por exemplo, o Sindicato dos Ferroviários, a Federação dos Trabalhadores marítimos etc., quando fazem frente aos patrões e ao governo, ou quando afirmam por sua prática sua solidariedade internacional aos trabalhadores de todos os países.
Mas é precisamente por causa de nossa simpatia e dos esforços que fazemos, e que pedimos aos camaradas para fazerem pelo movimento operário, que devemos evitar confundir o movimento anarquista com tal ou qual organização operária, e o anarquismo com o sindicalismo, a despeito do que ele pode representar em si como programa.
Vejamos esse problema mais a fundo.
Todo movimento que resiste e luta contra o patronato torna os trabalhadores conscientes da injustiça da qual são vítimas; incita-os a reivindicar e buscar condições de vida cada vez melhores; faz-lhes sentir a força emanada da união e da solidariedade; ressalta e acentua o antagonismo dos interesses que existe entre aqueles que trabalham e aqueles que fazem trabalhar; ele é, portanto, uma preparação da transformação social total à qual aspiramos.
Entretanto, o movimento operário não é revolucionário em si; por si mesmo, ele não pode conduzir à revolução. Bem mais: se faltarem os homens e os partidos que têm ideais superiores aos objetivos imediatos, que se servem do movimento operário como um meio para propagar suas ideias e atrair as massas para uma luta radical e definitiva contra as instituições atuais, então a organização operária torna-se facilmente um elemento de conservação social, conciliação e colaboração entre as classes, e ela tende a criar uma aristocracia e uma burocracia operária que se formam no grupo inicial de uma nova classe privilegiada, deixando a grande massa em um estado de inferioridade definitiva.
Existem provas abundantes dessa degenerescência do movimento operário na América, na Inglaterra, na França, na Alemanha e também na Itália com a Confederação Geral do Trabalho. As organizações operárias, emanadas do esforço de militantes animados por uma aspiração ardente à melhoria do bem-estar comum, prontos ao sacrifício, portanto plenamente revolucionários, sempre degeneraram tornando-se mais fortes porque deixaram desenvolver-se o espírito de corpo, porque preferiram os interesses específicos da organização aos da coletividade, as pequenas vantagens imediatas foram escolhidas em detrimento das grandes conquistas futuras que exigem lutas e sacrifícios contínuos.
Isso se explica facilmente. Uma organização operária não pode ser formada unicamente por operários emancipados intelectual e moralmente, que têm um ideal como programa e combatem para fazê-lo triunfar. Se assim fosse, ela seria apenas uma réplica dos grupos políticos, e seria inútil tanto para lutar contra os patrões quanto para a propaganda.
Cada organização operária apela às massas e busca arregimentar o maior número possível de pessoas. Para isso, é preciso permanecer no nível das generalidades e ressaltar, antes de tudo, os interesses imediatos dos trabalhadores: reivindicar melhorias possíveis hoje, não ultrapassar muito o nível das aspirações presentes nas diferentes corporações das localidades, tratar com os patrões e a autoridade, assumir, portanto, o papel de reformistas. Ora, o reformismo é um poço no fundo do qual fervilham as intrigas e a traição.
Felizmente existem homens conscientes do perigo e sempre em alerta; há espíritos rebeldes e generosos que desprezam as pequenas melhorias e estão prontos à luta final; mas o perigo existe, e a fim de evitá-lo, é necessário dentro e acima das organizações operárias que haja o movimento político, o grupo que obedece a um ideal e para que a revolução social (anarquista, no que nos concerne) seja o objetivo e todo o resto, um meio.
Para nós, as desconfianças e as rivalidades entre os diferentes grupos parecem-nos secundários. Ajudemos as organizações mais próximas de nós, combatamos aquelas que traem, aos nossos olhos, a revolução, mas também apoiemos a necessidade para os camaradas de infiltrar-se por toda parte para levar nossa propaganda e nosso espírito.
As massas são, mais ou menos, as mesmas em qualquer organização que elas estejam, e aquelas que estão fora de todas as organizações não são sempre as mais avançadas.
Nosso dever é trabalhar nas massas, em todas as massas. E, sobretudo, nosso dever é ser sempre nós próprios: anarquistas e revolucionários.