Título: O anarquismo frente ao conflito no campo
Data: Agosto de 2003
Fonte: https://livrozilla.com/doc/1343700/causa-do-povo---centro-de-mídia-independente
Notas: Em 2003, no Rio de Janeiro, ocorreu o congresso de fundação da Federação Anarquista Insurreição (FAI). No ano seguinte, durante o II Congresso realizado em 2004, a organização foi renomeada como União Popular Anarquista (UNIPA). A UNIPA reuniu militantes do movimento estudantil, sindical e comunitário, incluindo integrantes do coletivo Laboratório de Estudos Libertários (LEL). Esse coletivo foi responsável pela publicação do periódico Causa do Povo e da revista Ruptura, que se tornaram órgãos oficiais da UNIPA após sua fundação. Posteriormente, a revista Ruptura foi descontinuada e substituída pela publicação da revista Via Combativa. O artigo intitulado "O Anarquismo Frente ao Conflito no Campo" foi publicado originalmente na edição nº 5 do jornal Causa do Povo, em agosto de 2003.

No número 5 da Revista Ruptura, publicada em janeiro de 2003, dizíamos: “ ... a atual base produtiva do país dá peso demasiado ao setor agrárioexportador, reduzindo a margem de manobra de um governo em relação a reforma agrária e a estrutura fundiária de maneira geral. Não haverá reforma agrária pacífica, haverá pacificação militar do campo”. A análise que fizemos ao final do ano passado indicava que a questão da reforma agrária, no plano interno, seria a principal do plano político nacional, e que o papel jogado pelo movimento popular do campo, assim como pelas “elites civis militarizadas” e Militares, seria fundamental. Falamos também que o Governo Lula seria imprensado de um lado pelos movimentos sociais, e de outro pela burguesia com quem pactuou.

O cenário que prevíamos está já configurado. E não é com alegria que chegamos a essa conclusão, é com extrema preocupação. O encontro do MST com Lula, em que ele vestiu o boné do movimento, mostra toda a ambigüidade e perigo da situação. Ao mesmo tempo em que pactua com o Latifúndio, o PT quer manter aparência de amabilidade com os movimentos sociais. A direita não ficou nada satisfeita com o gesto, e exigiu uma postura firme do presidente. Enquanto isso os latifundiários se armam no campo, fazendo exibição dos seus arsenais e milícias. A mídia está coordenando uma grande campanha contra o MST: revistas Época e Veja editaram em suas capas nos últimos meses matérias denunciando a violência dos “sem-terra”. As emissoras de TV fazem um bombardeio de matérias jornalísticas, no mesmo sentido. Há uma campanha ideológica que exige a pacificação (repressão indiscriminada) no campo brasileiro, entendendose por isso a liquidação dos movimentos sociais rurais.

O Governo Lula pode parecer hesitante, mas no entanto dá indícios de que sabe exatamente o que está fazendo. Pelas declarações de José Dirceu, parece que o Governo ainda está apostando num esvaziamento da luta popular pela terra, em traze-la para certos compromissos, e assim “disciplinar” sua ação dentro da legalidade. O PFL, o PMDB e o PSDB (e os latifundiários) não aceitam (ou não entendem) tanto “refinamento”, que vêem como vacilação. Ao que nos parece, se a expectativa do Governo Lula não se cumprir num curto prazo (menos de 6 meses), a tendência é a pressão da direita aumentar, fazendo com que o Governo Lula fique numa encruzilhada: ou demonstrar lealdade à burguesia, ou perder credibilidade interna e externa, e aí só Deus sabe o que pode acontecer. Mas é possível que o PT não vislumbre esta possibilidade: na hora exata, ele vai lançar uma ofensiva no campo, para tentar desarticular, pelo menos, o MST.

A prisão dos cinco sem-terra no Pontal do Paranapanema (em SP), no dia 11/07/2003, e a condenação de José Rainha a 2 anos e 8 meses de prisão, no dia 30/07/2003, são apenas indicadores da agravação do quadro que havíamos indicado. Não será de surpreender, se nos próximos 12 meses assistirmos o Governo Lula decretar estado de defesa em determinadas regiões do país (áreas para isso seriam SP, Nordeste e Mato Grosso do Sul). Até agora todos os atores importantes se pronunciaram, menos um: os militares. Talvez o silêncio seja mais sintomático. Talvez eles já estejam em ação, ou preparando-a. Talvez sejam o plano B do Governo Lula para o conflito no campo. Convocamos os movimentos sociais a desenvolverem uma firme oposição ao Governo Lula, e ao capitalismo como um todo. Já está provado que ao povo nada será dado e tudo será conquistado com luta e organização autônoma. È hora de cerrar fileiras junto ao movimento popular do campo (em toda a sua diversidade e não só o MST). Tendo por lema: A agressão feita a um é a agressão feita a todos.

Anarquismo é Luta!
Morte ao Latifúndio!