Federação Revolucionária Anarquista Love and Rage
Que Tipo de Organização Revolucionária é Útil Hoje?
Os múltiplos problemas que o mundo enfrenta hoje exigem uma resposta revolucionária. Os problemas enfrentados pelus oprimides — especialmente pessoas de cor — não existem porque a promessa da democracia liberal ainda não foi cumprida em todo o mundo, mas devido a contradições inerentes ao liberalismo e ao próprio capitalismo. Como o capitalismo exige que muitos trabalhem pelo lucros de poucos, a sociedade moderna não pode fornecer liberdade total para todes. Além disso, como o capital não entregará sua posição de privilégio sem luta, a luta por uma sociedade verdadeiramente livre exige uma luta revolucionária contra o capitalismo e todas as formas de opressão.
Diante disso, a questão revolucionária é: que tipo de organização é eficaz neste momento? Historicamente, houveram duas respostas para essa pergunta. A mais comum é o partido de vanguarda marxista-leninista. A estratégia de vanguarda, da Revolução Russa até o presente, é construir uma organização de um quadro de elite de militantes que guiará as massas por uma revolução e as levará a uma sociedade socialista. Esta estratégia provou ser um fracasso total porque não cumpriu a promessa de liberdade. Ao criar uma organização altamente centralizada e antidemocrática, as abordagens de vanguarda reproduziram essas mesmas estruturas de poder na sociedade, com o partido como a nova classe dominante.
A segunda estratégia é menos conhecida, mas atualmente é popular em muitos círculos anarquistas norte-americanos. Esta estratégia, que poderia ser chamada de vitrine para a mudança social, defende a criação de “Zonas Autônomas Temporárias” (TAZ) de coletivos, infoshops, centros comunitários e outros postos avançados contraculturais em todo o país. Essas vitrines, diz o argumento, inspirarão milhares de outras TAZs a brotar organicamente no resto da sociedade, transformando o mundo sem um centro de poder ou uma cadeia hierárquica de comando. Esta estratégia é admirável por sua crítica ao autoritarismo e por seu comprometimento com formas descentralizadas de organização. No entanto, é irrealista porque não apresenta um plano para desafiar diretamente e derrotar as estruturas fundamentais do poder estatal. Nem sugere uma maneira de democraticamente reunir essas múltiplas TAZs e vitrines para criar coletivamente uma visão de uma sociedade livre.
A ineficácia de ambas as estratégias exige uma resposta diferente. Essa terceira visão, que poderia ser chamada de pluralismo revolucionário, é a posição que a Love and Rage adotou após seis anos de debate e luta. Ela se baseia em nossa percepção de como será um movimento de massas no século XXI contra a opressão. Embora os movimentos voltados para a organização de trabalhadores de fábrica possam ter sido apropriados no final do século XIX e início do século XX, o cenário em constante mudança do capital e do imperialismo se tornou muito mais complexo hoje. Os movimentos de massa contra eles inevitavelmente refletirão essa diversidade e complexidade. As lutas de mulheres, pessoas de cor e nacionalidades oprimidas em todo o mundo não são mais secundárias à luta do “proletariado” (na realidade, elas foram?), mas constituem o potencial, em sua pluralidade, de serem as bases para um novo movimento de massa. O que unirá essas lutas e povos diversos? Apenas um esforço deliberado para unir-lhes em um movimento radicalmente democrático e plural que manterá sua autonomia e desafiará a estrutura de poder existente. Isso é pluralismo revolucionário.
Se os movimentos de massa do século XXI serão plurais, diversos e vão emanar de uma variedade de locais, qual é o papel de uma organização revolucionária? Claramente, tal organização não deve tentar se tornar a “vanguarda” e forçar todo o movimento a se conformar à sua ideologia e ser subordinado aos seus próprios órgãos de poder. No entanto, isso não significa que não há nenhum papel para a organização revolucionária, como os defensores da vitrine afirmam. O papel de uma organização revolucionária como a Love and Rage em um movimento de massa não é liderar o movimento, mas participar dele como iguais a outras organizações e pessoas. Por meio dessa participação, buscamos fazer duas coisas:
1) Defender o movimento de massas mais democrático possível, um que dê a cada pessoa a capacidade de participar dele plenamente; e
2) Defender nossa proposta antiautoritária dentro deste movimento plural para influenciá-lo a lutar contra todas as formas de opressão.
Claro, um movimento de massa plural e diverso não existe na América do Norte. Atualmente, grupos como a Love and Rage são organizações sem um movimento. Não pretendemos ser capazes de ser esse movimento nem de criá-lo nós mesmes. Esse é o trabalho de milhões de oprimides. No entanto, podemos e participamos de pequenos movimentos agora mesmo, com o objetivo não apenas de vencer essas lutas menores, mas também de uni-las em um movimento maior. Fazemos isso por meio da participação ativa e argumentando por nossas posições de forma livre e aberta.
Com isso em mente, a Love and Rage vê três lutas atuais que ainda não são movimentos de massa mas que têm grande potencial. A luta contra a supremacia branca — não apenas contra a extrema direita, mas também contra as principais instituições desta sociedade (policiais, tribunais, capital) — será fundamental para qualquer movimento revolucionário. Em segundo lugar, a revolta zapatista indica que o México será um ponto central de resistência à ordem global no próximo século, e por isso trabalhamos para apoiar nossos camaradas no México e abrir uma “frente norte” nos EUA e Canadá. E finalmente, focamos a atenção nas prisões e no sistema de justiça criminal, não apenas para apoiar nosses camaradas revolucionários preses, mas também para revelar as prisões como o eixo do controle social sob o capitalismo e como uma arma fundamental do genocídio negro. Juntamente com o pluralismo revolucionário, essas três lutas oferecem um guia para construir um novo mundo dentro na complexa e confusa casca do terrível em que vivemos agora.