Título: Crime e Criminosos
Data: 25 de março de 1906
Notas: Título original: Crime and Criminals. Texto publicado originalmente no periódico The Liberator em 25 de março de 1906. Esse periódico foi editado pela Lucy Parsons de 1905 até 9999 e era publicado pela Industrial Workers of the World (IWW). Traduzido por Escurecendo o Anarquismo

Nossos santos cristãos e outras pessoas de boa índole levantam as mãos em horror, ao contemplar a prevalência do crime entre as “classes mais baixas”. Crimes, ou atos não sociáveis entre as “classes mais baixas”, são apenas um reflexo de crimes ou roubos das classes superiores ou “melhores classes”. Nós roubamos nossos filhos antes que eles nasçam. Quantos milhares, talvez milhões, de mães entre a classe trabalhadora existem que veem mil e um artigos enquanto estão em um estado de gravidez onde seu apetite anseia ou seu coração deseja e, ainda assim, são incapazes de satisfazê-lo? Elas andam pelas ruas, admirando as vitrines maravilhosas, tudo para atrair os olhos e causar ao coração o desejo, ainda incapaz, devido à pobreza, de satisfazer tamanhos anseios naturais. Qual é a consequência?

O filho ainda não nascido fica impressionado, ele sente o mesmo desapontamento que a mãe sente; ele fica impressionado por isso. Nós o assaltamos antes do nascimento. Ele adentra ao mundo com uma natureza de cobiça não satisfeita. Essa tendência aumenta firmemente com o passar dos anos; o desejo aumenta por causa da pobreza e, finalmente, a criança estende a mão e toma a propriedade de alguém. Isso é roubo, é realizado de forma ilegal; então a sociedade, pela primeira vez, demonstra interesse nesse ser humano. Ela avança para punir a criança. Está pronta agora para infligir tortura à vítima do seu próprio sistema falso, antinatural e desumano. Quão melhor, mais inteligente e barato teria sido tornar as condições naturais e sociais para que a criança visse a luz da Terra sob as melhores condições possíveis ao invés de — como é quase sempre o caso — sob as piores condições.

Quão melhor isso seria do que construir prisões enormes e sombrias, supervisionadas por carcereiros, os quais enrijecem e corrompem suas naturezas ainda mais. E o caso também é verdade para assassinatos, legais ou ilegais, ou linchamentos. A mídia sensacionalista dá todos os sangrentos detalhes de tais ocorrências em manchetes enormes gritantes. Elas chamam a atenção de milhares de futuras mães; elas são impressionadas pelo horror e seus detalhes e elas, por sua vez, impressionam seus filhos ainda não nascidos. A criança nasce, atinge o estado de homem e mulher, alguma adversidade cruza seu caminho e a antiga impressão pré-natal corre sobre ela e uma terrível ação é cometida! A comunidade se choca e imagina de onde tamanho monstro poderia ter saído. Outro candidato se inicia para a prisão ou para a forca. Assim, a longa procissão está sempre trilhando seu caminho através dos tempos. A velha bruxa de cabeça grisalha, a sociedade, joga suas mãos para cima em horror “sagrado” quando um dos seus filhos comete um ato horrível. Ela nunca reconhece o fato de que é apenas um reflexo das suas próprias maldades. O crime é apenas uma doença social.

Quando a sociedade se desenvolver o suficiente para suplantar a prisão por escolas, pôr o professor no lugar do carrasco e um tratamento generoso no lugar da punição e substituir a justiça e bondade no lugar da brutalidade, nós ouviremos bem menos sobre “crimes e criminosos”.