Nota do Tradutor: Dada a vertente esposada pelos autores, optei por traduzir comrade não como camarada mas como comparsa. Acredito que o autor aprovaria.
Paul Z. Simons, El Errante
Puramente Negro
Um Consenso Emergente Entre Alguns Comparsas?
Recentemente, o termo anarquismo "negro" tem sido jogado por aí no milieu e nos jornais internacionais. De fato, durante algumas das minhas últimas viagens através das Américas do Sul e do Norte e da Europa, eu tenho notado tentativas repetidas de definir, através de ação e teoria, as idéias associadas à anarquia negra. O que segue é um rápido e incompleto contorno de alguns do aspectos mais comuns do que anarquistas negros pensam e fazem. Essas tendências estão numeradas por conveniência, e não demonstram prioridade ou importância.
Excurso Vermelho: Eu não vou discutir anarquia "vermelha" já que ela parece ser bem definida pelas variantes coletivistas, sindicalistas e comunistas das idéias anarquistas, que foram desenvolvidas mais de cem anos atrás e ainda gozam de uma grande popularidade e um grande número de aderentes. Eu enfatizo que eu não vejo os dois caminhos como mutualmente exclusivos, opostos, ou mesmo necessariamente diferentes no nível macro. Os velhos sectarianismo e exclusão, mordentes sintomas do marxismo e da social democracia, não tem papel neste ensaio. Eu estou tentando descrever e prover uma topografia para um crescente, relativamente novo, acordo entre um grupo particular dos meus comparsas, e fazendo isso eu apoio e encorajo aqueles que seguem diferentes idéias e caminhos anarquistas. Ninguém está errado, ninguém está certo. O melhor que podemos esperar é clareza, não hegemonia.
1) Violência
Neste contexto violência é definida como uma tática, quer seja aplicada à insurreição, revolta, attentat, ou simples recusa. Existe um consenso quase irresistível entre anarquistas negros que o uso de violência é necessário, de fato desejável, talvez essencial. O crescimento de várias células FA(I)-IRF[1], o exemplo do CCF[2] grego e do Revolutionary Struggle, concomitante com o crescimento das não-anarquistas mas igualmente engajantes ações dos eco-extremistas no México, Chile e Brasil, e a miríade de queimas anônimas, destruição de caixas eletrônicos, e atauqes que populam a mídia anarquista atual globalmente ecoam esta ressonância. Quer seja o Molotov viajando em parábola graciosamente pelo ar noturno, a barricada em chamas, ou o mastro - transformado em cacetete - atingindo um osso fascista, o anarquista negro recebe com aprovação.
2) Individualista
Existe uma veia individualista forte no anarquismo negro, principalmente em função da atividade e menos devido à noites lendo Stirner até ficar sem fôlego. Em essência, quando engajado em ações é mais fácil funcionar em pequenos grupos, e algumas vezes sozinho do que tentar construir organizações grandes - ou mesmo médias. Estes pequenos grupos que chamarei de times, uma palavra roubada dos nossos comparsas atenienses, trazem ao relevo claro a importância da iniciativa individual, eles descentralizam decisão e ação.[3]
3) Niilista
Nesta instância, vou interpretar niilismo como a realpolitik do anarquismo em 2017 - todas as várias idéias, conceitos e presunções de uma vitória anarquista via revolução ou insurreição no contexto presente são nada mais que crack político. Uma vez que esse simples e óbvio fato seja aceito, existem dois caminhos, resignação com lassitude ou ataque selvagem sem nenhuma esperança real de sucesso. O anarquista negro escolhe o último, sempre.
4) Ilegalista
Uma parte do consendo anarquista negro é o desejo de rejeitar completamente qualquer acordo ou cooperação com o estado-nação, Capital, e mercados. Levando muitos no milieu a praticar conscientemente atividades políticas ilegais. Isso varia de lugar para lugar, mas inclui as atividades positicas de squatting, ocupações, furto à lojas, roubo descarado, arrombamento e mais. Em termos de atividades negativas, esta nova variante do ilegalismo inclui a recusa à todos os impostos, pedágios, programas de distribuição de renda, ONGs, e clínicas populares geridas pelo estado.
5) Organização Informal
Existe um medo real e saudável de organização formal entre os anarquistas negros. A tendência anti-organizacional não é nova no histórico do milieu anarquista, nem nos vários anarquismos que viram a luz do dia desde os anos 1970 nos EUA, Canadá e partes da Europa ocidental. O desposo aberto de estruturas informais e temporária e aderência limitada à preceitos organizacionais é, entretanto, bem nova. Este afrouxamento da forma organizacional, a inclusiva postura laissez-faire adotada por anarquistas negros e suas organizações pode ser uma das contribuições mais duradoras da tendência. Na maioria dos casos históricos, anarquistas tem construído organizações que virtualmente vazam as idéias e características da sociedade dominante. Em alguns poucos anos os anarquistas negros tem cometido grandes violência teórica contra tal baboseira organizacional, e no futuro eu espero que eles façam mais.
Este contorno do anarquismo negro é curto, incompleto, uma peça de jornalismo, não conjectura. Isto é o que eu vi, o que eu experimente nos últimos anos visitando e trabalhando com anarquistas em três continentes. E ao mesmo tempo um in memoriam e um prospecto de futuro.
[1] FAI - Federação Anarquista Informal, movimento originado na Itália sob o nome Federazione Anarchica Informale.
[2] Conspiracy of Fire Nuclei, Conspiração das Células de Fogo, organização grega. Em grego: Συνωμοσία των Πυρήνων της Φωτιάς, Synomosía ton Pyrínon tis Fotiás ou SPF.
[3] No original, os autores encerram este parágrafo com um trocadilho excelente mas sem equivalente em português: There is no I in team, there is an “m” and an “e”.