Ricardo Flores Magón
O Povo Mexicano é Apto para o Comunismo
O Povo Mexicano está apto ao Comunismo
Ricardo Flores Magón
2 de Setembro de 1911
Os habitantes do estado de Morelos, como os de Puebla, Michoacán, Durango, Jalisco, Yucatán e outros estados, onde vastas áreas foram invadidas por proletários que imediatamente dedicaram-se ao cultivo das terras mostraram ao mundo inteiro com seus atos que não é preciso uma sociedade de sábios para resolver o problema da fome. Para chegar a este resultado tomaram posse da terra e dos instrumentos de produção no México. Eles não precisavam de “dirigentes”, nem de “amigos da classe trabalhadora”, nem de “decretos paternos”, nem “leis sábias” – eles não precisavam de nada disso. Suas ações fizeram tudo e continuam fazendo tudo. O México está marchando em direção ao comunismo mais rapidamente do que os revolucionários mais extremos esperavam, e o governo e a burguesia agora se encontram sem saber o que fazer na presença de atos que eles acreditavam estar muito longe de serem realizados.
Não foram nem três meses atrás quando Juan Sarabia, numa longa e fastidiosa carta aberta dirigida a mim, que foi publicada na imprensa burguesa do México, me disse que a classe trabalhadora não entende o que estamos defendendo e que o povo ficou satisfeito com os frutos da revolta de Madero: a urna eleitoral. Mas os fatos mostraram que nós, membros do PLM (Partido Liberal Mexicano) não temos ilusões, e que lutamos convencidos de que nossas ações e propaganda respondem às necessidades e ao modo de pensar dos pobres do México. O povo mexicano odeia, por instinto, a autoridade e a burguesia. Todos os que já viveram no México pode nos assegurar que não há ninguém odiado mais cordialmente que o gendarme, que a palavra “governo” enche de inquietação o povo simples, que o soldado, admirado e aplaudido em todos os outros lugares, é visto com antipatia e desprezo, e que quem não ganha o seu viver com as mãos é odiada.
Isso por si só é suficiente para uma revolução social de caráter econômico e antiautoritário, mas há mais. No México vivem uns 4 milhões de indígenas, até vinte ou vinte e cinco anos atrás, vivia em comunidades que possuíam as terras comunalmente, as águas e as florestas em comum. A ajuda mútua era a regra nessas comunidades, nas quais a autoridade era sentida apenas quando o cobrador de impostos aparecia periodicamente ou quando apareciam “recrutadores” em busca de homens para forçar no exército. Nessas comunidades não havia juízes, governadores, carcereiros, nem nenhum bicho dessa classe. Todos tinham direito à terra, à água para regá-la, as florestas para lenha, e à madeira das florestas para a construção de pequenas casas. Os arados passavam de mão em mão, assim como juntas de bois. Cada família trabalhava tanta terra que calculava ser o suficiente para produzir o que era necessário, e o trabalho de capinar e colher era feito em comum por toda a comunidade — hoje a colheita de Pedro, amanhã de Juan e assim sucessivamente. Para fabricar uma casa, todos os membros da comunidade colocavam as mãos á obra.
Esses costumes simples duraram até que a autoridade se tornasse forte o suficiente para pacificar o país, até que era forte o suficiente para garantir à burguesia a prosperidade de seus negócios. Os generais de as revoltas políticas receberam grandes quantidades de terras; os latifundiários aumentaram o tamanho de seus feudos; os políticos mais vis receberam terrenos baldios imensos; e os aventureiros estrangeiros conseguiram concessões de terras, florestas, rios, de, enfim, tudo, deixando nossos irmãos indígenas sem um palmo de terra, sem o direito de tirar das matas nem o menor galho de uma árvore; eles foram deixados na miséria mais abjeta, despojados de tudo que tinha sido deles.
No que diz respeito à população “mestiça”, que é a maioria dos habitantes da República do México - com exceção daqueles que habitavam as grandes cidades e dos povoados de alguma importância, contavam igualmente com terras comunais, bosques, terras e corpos d'água em comum, assim como a população indígena. A ajuda mútua também era a regra; eles construíram suas casas juntos; a moeda quase não era necessária porque trocavam o que produziam ou cultivavam. Mas com a chegada da paz, a autoridade cresceu, e os bandidos da política e do dinheiro roubaram descaradamente as terras, matas; eles roubaram tudo. Mas não fazem quatro anos atrás se via nos jornais da oposição que o norte-americano X, o alemão Y ou o espanhol Z acabaram com toda uma população dentro dos limites de “sua” propriedade, com a ajuda das autoridades mexicanas.
Vê-se então, que o povo mexicano é apto para o comunismo porque o praticou, pelo menos em parte, por muitos séculos e isso explica porque mesmo quando a maioria é analfabeta, eles compreendem que melhor do que participar de farsas eleitorais que elegem bandidos, é tomar posse das terras — e é essa tomada que escandaliza a burguesia ladra.
Agora resta apenas que os operários tomem posse da fábrica, da oficina, da mina, da fundição, da estrada de ferro, do navio, de tudo para colocar em uma palavra - que não se reconheça patrões de qualquer classe e esta será a culminação do movimento atual. Avante camaradas!