Ricardo Flores Magón

O Rifle

1911

Eu sirvo a duas facções: A facção que me oprime e a facção que liberta. Eu não tenho preferências. Com a mesma fúria, com o mesmo som, eu atiro a bala que arranca a vida do soldado da liberdade ou do capanga da tirania.

Trabalhadores me fizeram, para matar trabalhadores. Eu sou o rifle, o matador da liberdade quando eu sirvo os de cima, ou a arma da emancipação quando eu sirvo os de baixo.

Sem mim, não haveriam tantos homens que dizem “eu sou mais que você”, e sem mim, não haveriam escravos que gritam “abaixo com a tirania!”.

O tirano me chama de “a coronha das instituições”. O homem livre cuida de mim com cuidado e me chama de “instrumento da redenção”. Eu sou, ao mesmo tempo, o assassino e o vingador, dependendo das mãos que me carregam.

Eu também posso dizer em quais mãos eu já estou. Essas mãos tremem? Então sem dúvidas são as mãos do oficial militar. É um pulso firme? Eu digo sem vacilar: “Essas são as mãos da libertação”.

Eu não preciso ouvir o clamor de qual facção está me usando. Eu o suficiente para mim ouvir o ranger de dentes para saber que estou na mão dos opressores. Esse mal é um mal covarde, o bem (verdadeiro) é valoroso. Quando o oficial me apoia em seu colo para me fazer vomitar a morte contida no meu carregador, eu sinto o coração dele saltar com violência. É porquê ele está consciente de seu crime. Ele não sabe quem ele vai matar. Ele recebeu a ordem: “atire!”, e aqui vai o tiro que talvez vá perfurar o coração de seu pai, seu irmão, ou seu filho e atravessar alguém que foi invocado pelo honrado grito “Revolução!”.

Eu vou existir nessa terra enquanto haver uma humanidade estúpida que insiste em se dividir em duas classes: os ricos e os pobres, aqueles que consumem e aqueles que sofrem. Quando o último capitalista desaparecer e a sobra da autoridade se dissipar, eu vou desaparecer por minha vez, consagrando meus materiais para a construção de arados e os mil instrumentos que homens transformados em irmãos irão manejar com entusiasmo.


Traduzido do Espanhol por Mitchell Cowen Verter, tirado de "Regeneración" número 64, 18 de novembro de 1911. Traduzido para o português por Solano Alves.