Originalmente escrito em francês, mas “com espírito e estilo deliberadamente espanhóis”, o comunicado "Aos Libertários" foi assinado por Guy Debord e sua companheira Alice e publicado na Espanha em setembro de 1980. Entre 1979 e 1984, Debord deixou Paris para viver entre a Itália e a Espanha, experiência que rendeu importantes análises políticas sobre as novas técnicas de governo em gestação na Itália, naquela altura o “laboratório mais moderno da contrarrevolução internacional”, além de ter colaborado com o início de uma movimentação internacional contra o encarceramento de dezenas de libertários espanhóis vítimas tanto do regime pós-franquista, quanto do silêncio mantido pela “C.N.T. reconstituída” sobre essa questão, considerada “prioritária” pelo antigo situacionista. Menos de dois meses após a publicação do libelo Aos libertários (e contra o regime espanhol) os anarquistas nele citados seriam soltos por “falta de provas”.[1]

***

Aos libertários [2]

Guy Debord e Alice Becker-Ho


Estimados camaradas,

Lamentamos chamar-vos a atenção para uma questão grave e urgente que, normalmente, vocês deveriam conhecer bem melhor do que nós que estamos distantes e estranhos a ela. Mas somos obrigados a constatar que diversas circunstâncias têm até agora os colocado na impossibilidade de tomar conhecimento dos fatos ou de sua significação. Por isso, acreditamos dever expor claramente esses fatos, assim como as circunstâncias que os impediram de tê-los conhecido.

Mais de cinquenta libertários estão detidos nesse momento nas prisões da Espanha, muitos deles há vários anos sem julgamento. O mundo inteiro – que houve falar diariamente das lutas travadas pelos Bascos –, ignora completamente este aspecto da atual realidade espanhola. No próprio país, a existência e os nomes destes camaradas são vez em quando citados por um setor restrito da opinião pública, mas, em geral, silencia-se sobre o que eles fizeram e sobre suas motivações; e nada de concreto é feito para a libertação deles.

E quando nos endereçamos a todos vocês, não pensamos, evidentemente, em reconhecer à C.N.T., tal como ela foi reconstituída, um papel central de representação dos libertários: todos os que nela estão dela não fazem parte, e todos os que fazem parte dela, nela não estão.

A hora do sindicalismo revolucionário passou há muito tempo porque, sob o capitalismo modernizado, todo sindicalismo tem seu lugar garantido, pequeno ou grande, no espetáculo da discussão democrática sobre as reestruturações no estatuto do salariato, isto é, na posição de interlocutor e cúmplice da ditadura do salariato: pois democracia e salariato são incompatíveis, e esta incompatibilidade, que sempre existiu de modo essencial, manifesta-se visivelmente em nossos dias, em toda a superfície da sociedade mundial.

A partir do momento em que o sindicalismo e a organização do trabalho alienado se reconhecem reciprocamente, como duas potências que estabelecem entre si relações diplomáticas, qualquer sindicato desenvolve nele mesmo outra espécie de divisão do trabalho, para poder prosseguir com a sua atividade reformista cada vez mais ridícula. O fato de um sindicato se declarar ideologicamente hostil a todos os partidos políticos, de forma alguma o impede de estar nas mãos de sua própria burocracia de especialistas da direção, como qualquer partido político. Cada passo de sua prática real o demonstra. Os fatos aqui evocados ilustram-no perfeitamente, já que, se na Espanha os libertários organizados dissessem o que deveriam dizer, nós não teríamos que dizê-lo em seu lugar.

Dos cinquenta libertários feitos prisioneiros, a maioria na prisão de Segóvia, mas também em outras (“Prisão Modelo” de Barcelona, “Carabanchel” e “Yserias” de Madri, Burgos, Herrera de la Mancha, Soria...), vários são inocentes, vítimas das clássicas provocações policiais. Pouco se fala deles, eles que, em princípio, alguns parecem dispostos a defender, porém passivamente. No entanto, a maioria deles efetivamente dinamitou ferrovias, tribunais, edifícios públicos. Eles recorreram a expropriações à mão armada contra diversas empresas e um bom número de bancos. Trata-se notadamente de um grupo de operários da SEAT de Barcelona (que no momento são conhecidos como “Ejercito Revolucionario de Ayuda a los Trabajadores”), que transportava aportes pecuniários em espécie aos grevistas de sua fábrica, como também a desempregados; e também de “grupos autônomos” de Barcelona, Madri e Valencia, que agiram igualmente, na intenção de propagar a revolução por todo o país. Estes são os camaradas situados nas posições teóricas mais avançadas. É deles que não se fala em todos os lugares e que tanta gente prefere esquecer, enquanto o procurador os condenam a penas individuais de trinta a quarenta anos de prisão.

***

O Estado espanhol, com todos os partidos que, no governo ou na oposição, lhe reconhecem e lhe apoiam, as autoridades de todos os países estrangeiros, neste ponto todas amigas do estado espanhol, e a direção da C.N.T. reconstituída, todos, por diferentes razões, têm interesse em manter esses camaradas no esquecimento. E nós, que temos um interesse precisamente contrário, vamos dizer por que eles o fazem.

O Estado espanhol herdeiro do franquismo, democratizado e modernizado conforme é preciso para ocupar sua posição banal nas condições ordinárias do capitalismo moderno, e tão apressado em se fazer admitir no deplorável “Mercado Comum” da Europa (que de fato o merece), se apresenta oficialmente como a reconciliação entre os vencedores e os vencidos da guerra civil, isto é, entre franquistas e republicanos. As nuances tem aí pouca importância: se, do lado dos democratas estalinistas, Carrilo talvez seja no presente um pouco mais monarquista que Berlinguer, em contrapartida, do lado dos príncipes do direito divino, o rei da Espanha é seguramente tão republicano quanto Giscard d’Estaing. Mas a verdade mais profunda e mais decisiva, é que o Estado espanhol de hoje é, efetivamente, a reconciliação tardia de todos os vencedores da contra-revolução. Eles finalmente estão reunidos amigavelmente, na cordialidade que ambos se deviam reciprocamente, os que quiseram ganhar e os que quiseram perder, os que mataram Lorca e os que mataram Nin. Pois todas as forças que, naquele tempo, estiveram em guerra contra a República ou mesmo controlavam os poderes dessa República – são todos os partidos que hoje ocupam as Cortes – perseguiram, de diversas maneiras sangrentas, e atingiram o mesmo objetivo: abater a revolução proletária de 1936, a maior que a história viu nascer até hoje e, portanto, também aquela que ainda melhor prefigura o futuro. A única força organizada que então teve a vontade e a capacidade de preparar esta revolução, de fazê-la e – embora com menos lucidez e firmeza – defende-la, foi o movimento anarquista (apoiado unicamente, e numa medida incomparavelmente mais frágil, pelo P.O.U.M).

O Estado e todos os seus partidários não esquecem jamais essas terríveis lembranças, mas se dedica continuamente em fazer o povo esquecê-las. Eis porque o atual governo prefere manter o perigo libertário na sombra. Ele prefere mais, evidentemente, falar do G.R.A.P.O., forma ideal de um perigo bem controlado, já que o grupo é, desde a origem, manipulado pelos Serviços Especiais, exatamente como as “Brigadas Vermelhas” na Itália, ou como a pseudo-organização terrorista, de nome ainda impreciso, de quem o governo francês anuncia há alguns meses, por uma série de golpes baixos, a oportuna entrada em cena. O governo espanhol, satisfeito com sua G.R.A.P.O., ficaria sem dúvida muito contente em não ter mais o que falar dos Bascos. No entanto ele se vê obrigado a isso por suas lutas efetivas. Mas, no fundo, os Bascos combatem para obter um Estado independente, e o capitalismo espanhol poderá sobreviver tranquilamente a tal perda. O ponto decisivo, no entanto, é que os Bascos sabem muito bem defender seus prisioneiros, que eles não deixam esquecer por um instante. A solidariedade sempre esteve em casa na Espanha. Se agora só a vemos entre os Bascos, ao quê irá se parecer a Espanha quando os Bascos se separarem dela?

Os outros Estados da Europa acomodariam facilmente um Euskadi independente, mas desde 1968 enfrentando uma crise social irremediável, eles estão tão interessados quanto o governo de Madri em não ver reaparecer uma corrente revolucionária na Espanha. O que significa, segundo as mais recentes técnicas da dominação: que não seja possível vê-la, mesmo quando ela reaparece. Estes mesmos Estados se lembram do que deveriam ter feito em 1936, os totalitaristas de Moscou, Berlim e Roma, tanto quanto os “democratas” de Paris e Londres, todos em acordo sobre a necessidade essencial de aniquilar a revolução libertária; e vários deles aceitando calmamente, para tanto, as perdas ou o aumento dos riscos nos conflitos mais secundários que os opõem entre si. Ora, hoje toda informação foi estatizada, de modo formal ou dissimulado. Toda imprensa “democrática” encontra-se tão apaixonadamente comprometida com a manutenção da ordem social que nem é mesmo necessário que seu governo a compre. Ela se oferece graciosamente para apoiar qualquer governo publicando exatamente o contrário da verdade sobre cada questão, mesmo pequenina; já que hoje a realidade de toda questão, mesmo as menores, tornou-se ameaçadora para a ordem estabelecida. No entanto, não há nada que dê mais prazer à imprensa, burguesa ou burocrática, do que esconder a realidade de uma ação revolucionária.

Enfim, a C.N.T. reconstituída prova nessa questão um incômodo real. Não é por indiferença ou por prudência que ela foi levada a se calar. Os seus dirigentes querem ser um polo de reagrupamento dos libertários sobre uma base sindicalista efetivamente moderada e aceitável para a ordem estabelecida. Os camaradas que recorreram às expropriações representam, deste modo, um polo de reagrupamento absolutamente contrário. Se uns têm razão, os outros se enganam. Cada um é filho de suas obras, e deve-se escolher entre uns ou outros examinando o sentido e a finalidade de suas ações. Se víssemos a C.N.T. conduzir grandes lutas revolucionárias durante esses últimos anos que os camaradas expropriadores passaram na prisão, então vocês poderiam concluir que esses últimos foram um pouco aventureiros e impacientes demais (e, aliás, a C.N.T., animando grandes lutas revolucionárias, teria assim mesmo, apesar das divergências, agido para defendê-los). Mas, se antes, vocês viram esta mesma C.N.T. se satisfazendo em apanhar algumas migalhas na modernização da Espanha, então é preciso admitir que aqueles que pegaram em armas não tinham, fundamentalmente, agido mal. Finalmente, foi o proletariado revolucionário da Espanha que, outrora, criou a C.N.T., e não o inverso.

Quando a ditadura julgou que o tempo de reformar-se um pouco havia chegado, muitos outros quiseram colher, nessa liberalização, algumas vantagenzinhas. Mas eles, os camaradas autônomos, imediatamente acharam desonrado contentar-se com isso. Eles logo sentiram a necessidade de exigir tudo, porque após ter sofrido verdadeiramente, durante quarenta anos, com toda a contra-revolução, nada justificaria esta injúria antes de se ter reafirmado e feito triunfar a revolução. Quem pode se dizer libertário, e censurar os filhos de Durruti?

As organizações passam, mas a subversão não cessará de ser animada: “¿Quién te vió y no te recuerda?” Hoje os libertários ainda são numerosos na Espanha, e eles serão bem mais numerosos amanhã. E felizmente, sua maior parte, justamente a maior parte dos operários libertários, agora é incontrolável.

Por toda Europa, cada vez mais gente se engaja em lutas particulares contra alguns aspectos insuportáveis, muito antigos ou muito novos, da sociedade opressiva. Todas essas lutas são necessárias: de que adianta uma revolução, se as mulheres e os homossexuais não são livres? Que tem de bom em um dia livrar-se da mercadoria e da especialização autoritária, se uma degradação irreversível do meio ambiente natural impõe novas limitações objetivas à nossa liberdade? Ao mesmo tempo, entre aqueles que estão seriamente engajados nestas lutas particulares, ninguém pode pensar em obter uma real satisfação de suas exigências enquanto o Estado não for dissolvido. Pois toda essa irracionalidade prática é a razão do Estado.

***

Não ignoramos que muitos libertários podem estar em desacordo com várias teses dos camaradas autônomos, e não queiram dar a impressão de que tenham ligação com eles ao defendê-los. Não se discute estratégia com camaradas que estão na prisão. Para que esta interessante discussão possa começar, é preciso primeiramente trazê-los de volta às ruas. Com essas opiniões divergentes que, engrossadas à luz de escrúpulos excessivos, correm o risco de levar alguns daqueles que finalmente se dizem revolucionários a não enxergar essa defesa como algo que lhes dizem respeito, acreditamos ser possível chegar a somente quatro tipos de considerações. Ou bem certos libertários têm outro entendimento, numa ótica menos impaciente ou mais cautelosa, sobre a situação atual da Espanha e suas perspectivas de futuro. Ou eles não estão de acordo sobre a eficácia das formas de luta que esses grupos autônomos optaram a esta altura. Ou eles bem entendem que estes grupos encontram-se deliberadamente em situação pouco defensável no plano dos princípios, ou sob o plano jurídico. Ou bem eles pensam lhes faltar completamente meios de intervenção. Nós achamos que podemos reduzir facilmente todas essas objeções a nada.

Aqueles que agora esperam alguma nova melhoria na situação sócio-política da Espanha são evidentemente aqueles que mais se enganam. Todos os prazeres da democracia permitida já passaram seus mais belos dias, e cada um pôde ver que eles não passavam disso que aí está. Daqui em diante tudo se agravará, na Espanha como no resto do planeta. Os historiadores geralmente concordam em considerar que o principal fator que, durante cem anos, tornou a Espanha revolucionária, foi a incapacidade de suas classes dirigentes em fazê-la chegar ao nível do desenvolvimento econômico do capitalismo que, ao mesmo tempo, assegurava aos países mais avançados da Europa, e aos Estados Unidos, períodos muito mais longos de paz social. Muito bem! A Espanha ainda deverá ser revolucionária por esta nova razão: se a classe dirigente modernizada do pós-franquismo, talvez, se mostrar mais hábil para atingir as condições gerais do capitalismo atual, ela chegará lá tarde demais, precisamente no instante em que tudo isso se decompõe. Constatamos universalmente que a vida das pessoas e o pensamento dos dirigentes se degradam um pouco mais a cada dia, e principalmente nesse infeliz “Mercado Comum” para onde todos os seus afrancesados no poder lhes prometem levar como se fosse a uma festa. A produção autoritária da mentira nele se agiganta até a esquizofrenia pública, o consentimento dos proletários se dissolve, toda ordem social se desfaz. A Espanha não se tranquilizará já que, no resto do mundo, a paz está morta. Outro elemento decisivo na propensão da Espanha à desordem foi seguramente o espírito da autonomia libertária, tão forte em seu proletariado. É justamente a tendência à qual a história deste século deu razão, e que se propaga por todo lado, já que por todo lado pudemos ver até onde conduziu o processo de totalitarização do Estado moderno, e a quais tristes resultados chegou, por meios canibalescos, o movimento operário dominado por burocracias autoritárias e estatistas. Deste modo, no momento em que, em todos os países, os revolucionários tornam-se, sobre esta questão central, espanhóis, vocês, vocês não podem pensar em se tornarem outros.

Compreendemos melhor ainda as objeções que podem ser feitas sobre um plano puramente estratégico. Podemos efetivamente nos perguntar se, por exemplo, pilhar bancos para empregar dinheiro na compra de fotocopiadoras, que em seguida servirão para publicar escritos subversivos, constitui a via mais lógica e mais eficaz. Mas, em todo caso, esses camaradas atingiram incontestavelmente a eficácia exigida, embora de outra maneira: simplesmente chegaram a ser presos por ter, perduravelmente e sem hesitação, aplicado o programa de ação que eles haviam traçado para si próprios. Eles prestaram um enorme serviço à causa da revolução, na Espanha e em todos os países, precisamente porque eles criaram um campo prático evidente que permitirá a todos os libertários esparsos na Espanha, aparecer e se reconhecer na luta por sua libertação. Pela sua iniciativa, eles pouparam vocês da penosa tarefa de buscar, através de longas e difíceis discussões, qual seria a melhor maneira de começar a agir. E não há melhor maneira do que essa, pois ela é muito justa na teoria e muito boa na prática.

Talvez, alguns libertários terão impressão de que a gravidade dos fatos, sob o plano judicial, torna mais difícil a defesa destes camaradas. Pensamos, pelo contrário, que é a própria gravidade destes fatos que facilita toda ação bem calculada a seu favor. Libertários não podem, por princípio, acordar valor a nenhuma lei do Estado, e isto é particularmente verdadeiro quando se trata do Estado espanhol: considerando a ilegalidade de sua origem, e todo seu comportamento ulterior, sua justiça não pode mais funcionar decentemente senão na forma de uma anistia proclamada permanentemente, para qualquer pessoa. De resto, atacar bancos é naturalmente um crime gravíssimo aos olhos dos capitalistas; não aos olhos de seus inimigos. Censurável é roubar os pobres, e justamente todas as leis da economia – leis detestáveis, a serem abolidas pela completa destruição do terreno real onde elas se aplicam – nos garantem que jamais um pobre se torne um banqueiro. Chegou a hora que, em uma ação onde houve troca de tiros, um guarda foi assassinado. A indignação humanitária da justiça a esse respeito parece suspeita em um país onde a morte e a violência é tão frequente. Em certas épocas, se pode morrer como em Casas Viejas ou como nas arenas de Badajoz. Em outras, segundo as necessidades tecnológicas de expansão do lucro, pode-se também morrer rápido, como duzentos camponeses pobres queimados em Los Alfaques ou setenta burgueses no luxo plastificado de um grande hotel em Saragossa. Dirão que nossos camaradas “terroristas” são responsáveis por tais hecatombes? Não, eles são tão culpados por elas quanto pela poluição do Golfo do México, já que todas essas miudezas ocorreram enquanto eles estavam presos.

A questão não é nada judicial. É uma simples questão de relação de forças. Já que o governo tem um interesse tão evidente ao ponto de não falar desses camaradas, basta que os obriguemos a falar deles, e de tal maneira que ele seja constrangido a concluir que o seu interesse mais imediato seja libertá-los, antes do que mantê-los aprisionados. Que o governo então optasse por chegar a este resultado por um processo onde eles seriam condenados ao número de anos de prisão que já cumpridos, ou ainda por uma anistia, ou deixando-os fugir, não importa. No entanto, devemos insistir no fato de que, enquanto não existir um movimento de opinião se exprimindo sobre seu caso de uma maneira suficientemente forte e ameaçadora, uma evasão facilitada pelas autoridades é perigosa: vocês conhecem bem a “ley de fugas” e acompanharam a sua aplicação diversas vezes.

***

Camaradas, nós não nos permitimos sugerir, a vocês que estão aí localizados e que, em função das circunstâncias, podem pesar as possibilidades e os riscos, uma ou outra forma de ação prática. Desde que seja explicitamente prioritária a exigência de libertação dos libertários, todas as formas de ação são boas, e aquelas que fazem mais escândalo são as melhores. Se agrupando por afinidades, vocês podem descobrir ou retomar, segundo seus gostos e as oportunidades, quaisquer meios de agir que foram empregados em outros tempos ou que ainda restam experimentar – recusando-se apenas a rebaixar-se ao nível das petições respeitosas que praticam em tudo e vãmente, os partidos da esquerda eleitoreira. Primeiramente, é inútil coordenar tais ações autônomas. Basta que elas converjam para um mesmo objetivo específico, proclamando-o a todo o momento, e multiplicando-o com o tempo. E quando esse objetivo específico for atingido, ocorrerá que essa corrente libertária, agindo, terá reaparecido, se fará conhecer e conhecerá a si mesma. Assim um movimento geral estará em marcha, que poderá coordenar-se cada vez melhor para objetivos cada vez mais amplos.

O primeiro objetivo a conquistar seria o de obcecar o país com este problema, o que equivale a fazer o mundo saber da existência do movimento revolucionário libertário na Espanha, obrigando todos a tomarem conhecimento da existência destes prisioneiros, assim como da eficiência daqueles que os defendem. É preciso que os seus nomes sejam conhecidos em todos os países onde os proletários lutam contra o Estado, desde os operários que conduzem as grandes greves revolucionárias da Polônia até aqueles que sabotam a produção fabril da Itália, os contestatários que vivem diante das portas dos asilos psiquiátricos de Brejnev ou dos presídios de Pinochet.

Como infelizmente são muitos para citá-los todos, podemos nos limitar a citar neste momento os nomes dos acusados contra quem a justiça já pronunciou penas de mais de vinte anos de prisão: Gabriel Botifoll Gómez, Antonio Cativiela Alfós, Vicente Domínguez Medina, Guillermo González García, Luis Guillardini Gonzalo, José Hernández Tapia, Manuel Nogales Toro. Mas deixamos bem claro que exigimos a libertação de todos os demais, inclusive dos inocentes.

O primeiro passo é tornar o problema amplamente conhecido; em seguida não deixá-lo ser esquecido, manifestando de modo cada vez mais intenso uma impaciência que só aumenta. Os meios se ampliarão no curso do movimento. Que uma pequena fábrica da Espanha ponha-se em greve um dia por esta reivindicação, e ela já servirá de modelo para o país inteiro. Basta fazer conhecer imediatamente sua atitude exemplar, e metade do caminho estará feito. Mas será necessário, de início, que não haja um só curso universitário, uma única representação teatral ou conferência científica sem que alguém, por uma interpelação direta ou por uma chuva de comunicados impressos, ponha a questão prioritária acerca do que foi feito com nossos camaradas, e a data em que eles deverão ser libertados. Será necessário que seus nomes sejam lidos em qualquer rua da Espanha. Será necessário ouvir por toda parte canções que falem deles.

***

Camaradas, se nossos argumentos lhes parecem justos, difundam e reproduzam com urgência este comunicado pelos meios que vocês têm a disposição, ou os que puderem tomar. Senão, jogue-o fora agora mesmo e comecem imediatamente a publicar outros melhores! Não há dúvidas de que vocês têm todo o direito de julgar rigorosamente nossos modestos argumentos, como não há a menor dúvida de que a realidade escandalosa que tentamos denunciar aqui não é, ela própria, objeto de vosso julgamento: ao contrário, é ela que, finalmente, irá julgá-los.

Saudações!

Viva a liquidação social!

Amigxs internacionais, 09/1980.

***

[Tradução de Erick Corrêa]

[In: COORDINATION DES GROUPES AUTONOMES D’ESPAGNE, Appels de la prison de Ségovie, Éditions Champ Libre, Paris, 1980. Tradução de Erick Corrêa.]

[1] In: COORDINATION DES GROUPES AUTONOMES D’ESPAGNE, Appels de la prison de Ségovie, Éditions Champ Libre, Paris, 1980. Tradução de Erick Corrêa.

[2] Tradução de Erick Corrêa